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Publicado em: 02/10/2025 | Atualizado em: 02/10/2025

Setembro Verde: Cristo Redentor recebe projeção e seminário discute importância da doação de órgãos

Cristina Cruz e Paula Guatimosim

Setembro Verde: projeção no monumento do Cristo Redentor selou o compromisso da FAPERJ com o fomento a pesquisas voltadas ao transplante de órgãos e tecidos (Foto: Flavia Machado)

Em um gesto simbólico que uniu ciência, fé e solidariedade, o Santuário Cristo Redentor recebeu na noite de sexta-feira, 26 de setembro, uma celebração eucarística em homenagem ao Dia Nacional da Doação de Órgãos. A missa, realizada aos pés de um dos maiores símbolos nacionais de esperança e compaixão, foi promovida pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado do Rio de Janeiro (SECTI), por meio da FAPERJ, em parceria com o Consórcio Cristo Sustentável. Logo após a celebração, o monumento ao Cristo Redentor recebeu uma projeção especial e foi iluminado em verde – cor da campanha nacional de conscientização sobre a importância da doação de órgãos, o Setembro Verde. O momento solene foi dedicado à reflexão, gratidão e reconhecimento à generosidade dos doadores e ao papel fundamental da ciência, da inovação e do Sistema Único de Saúde (SUS) no avanço dos transplantes no país.

Em 2024, o Brasil alcançou um recorde histórico de transplantes, com mais de 30 mil procedimentos, representando um crescimento de 18% em relação a 2022. Somente no primeiro semestre de 2023, foram registrados mais de 1.900 doadores efetivos, o maior número da última década, possibilitando a realização de mais de 4.300 transplantes de órgãos sólidos. Houve crescimento expressivo em diversas modalidades: 30% em transplantes de pâncreas, 20% de rins, 16% de coração e 9% de fígado. Os transplantes de córnea também aumentaram em 15%, com 7.810 procedimentos, e os de medula óssea chegaram a 1.838, um crescimento de 6%.

“A ciência tem sido essencial para o avanço dos transplantes no Brasil. A pesquisa e a inovação possibilitam salvar vidas e melhorar a qualidade de vida de milhares de pessoas. Esta celebração é um tributo à vida e ao poder transformador da generosidade humana”, destacou a presidente da FAPERJ, Caroline Alves.

Para o secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, Anderson Moraes, o momento representou a união entre fé, solidariedade e ciência. “Reunir pessoas no Cristo Redentor para homenagear doadores e profissionais da saúde é uma forma simbólica e poderosa de mostrar que a ciência caminha junto com o amor ao próximo. Celebramos o que há de mais nobre: doar para salvar vidas.”

A celebração contou com a presença de profissionais da saúde, pesquisadores, representantes de associações de pacientes transplantados, familiares de doadores e beneficiários de transplantes. Em parceria com o Consórcio Cristo Sustentável, a FAPERJ também apoiou o Centro de Acolhimento à Mulher Nossa Senhora do Parto, localizado na Catedral Metropolitana de São Sebastião do Rio de Janeiro, no Centro do Rio. A iniciativa acolhe e oferece suporte a mulheres, gestantes e puérperas em situação de vulnerabilidade social, a partir dos 14 anos.

O Consórcio Cristo Sustentável é uma aliança estratégica entre três organizações que atuam de forma integrada com o objetivo de promover ações coordenadas voltadas para a sustentabilidade ambiental, social e econômica. A colaboração interinstitucional entre Santuário Arquidiocesano Cristo Redentor, Obra Social Leste Um - O Sol e Instituto Redemptor viabiliza mudanças e transformações, acelerando a transição para um futuro mais sustentável, promovendo inovação, inclusão, conscientização e equilíbrio entre progresso econômico e preservação ambiental.

Seminário organizado pela FAPERJ e SECTI na Academia Nacional de Medicina discute importância da doação de órgãos

Como parte da programação do Setembro Verde, a FAPERJ uniu esforços à SECTI e promoveu, no auditório da tradicional Academia Nacional de Medicina (ANM), no Centro, um seminário sobre transplantes de órgãos e tecidos. O evento, realizado antes da solenidade no Cristo Redentor, durante a manhã e a tarde do dia 26 de setembro, reuniu especialistas, pesquisadores, gestores, transplantados e seus familiares.

A mesa de abertura contou com a participação da presidente da FAPERJ, do secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, do subsecretário estadual de Atenção à Saúde, Caio Souza; e dos médicos acadêmicos José Hermógenes Rocco Suassuna, Carlos Eduardo Brandão Mello, José Osmar Medina de Abreu Pestana, e do vice-presidente da ANM, Ronaldo Damião, que representou a presidente da entidade e diretora Científica da FAPERJ, Eliete Bouskela, e também é pró-reitor de Saúde da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Abrindo o seminário, foi apresentado um vídeo sobre a conscientização da necessidade da doação de órgãos, com depoimentos de transplantados e destacando a importância do doador manifestar sua intenção à família, que, em última instância, é quem autoriza a doação. Em seguida, Ronaldo Damião deu as boas-vindas, lembrando que o Brasil é o terceiro país que mais realiza transplantes no mundo, mas que a fila de doentes aguardando órgãos ainda é grande, e torna-se imprescindível aumentar ainda mais o número de doadores.

Mesa de abertura do seminário na Academia Nacional de Medicina: a partir da esq., Alexandre Cauduro, Caio Souza, Anderson Moraes, Ronaldo Damião, Caroline Alves, Hermógenes Suassuna e Carlos Eduardo Brandão, e, no telão, o nefrologista José Medina, em participação online (Foto: Paula Guatimosim)

Em uma apresentação online, o médico nefrologista José Osmar Medina de Abreu Pestana, professor da Escola Paulista de Medicina e diretor do Hospital do Rim, lembrou que 90% dos transplantes no Brasil são realizados pelo SUS, que também fornece gratuitamente os medicamentos necessários ao pós-transplante. Ele destacou a importância da Comissão Hospitalar de Transplantes na cadeia, formada por equipe multidisciplinar dentro dos hospitais, com a função principal de organizar o processo de doação e captação de órgãos e tecidos, incluindo a identificação de potenciais doadores, a abordagem e apoio às famílias.

Em seguida, o hepatologista Carlos Eduardo Brandão Melo, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e chefe do Ambulatório de Gastroenterologia e Doenças do Fígado do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, lembrou que o primeiro transplante de fígado entre vivos foi realizado no Brasil, em 1988, por uma equipe liderada pelo acadêmico Silvano Raia no Hospital das Clínicas (SP). “Hoje, o transplante de fígado é uma realidade no Brasil”, afirmou.

O nefrologista Hermógenes Rocco Suassuna, coordenador da disciplina de Nefrologia da Faculdade de Ciências Médicas e do Setor de Hemodiálise do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Hupe/Uerj) afirmou que o estado do Rio de Janeiro tem uma atividade transplantadora sólida. Ele ressaltou a importância do seminário promovido pela FAPERJ, destacando que o evento abre um diálogo com a sociedade, também uma das metas da atual gestão da presidente da ANM, Eliete Bouskela.

A presidente da FAPERJ, Caroline Alves, que há 10 anos precisou fazer um transplante de fígado, lembrou que desde que assumiu a presidência da Fundação, a pedido do secretário de CT&I e do governador do estado do Rio de Janeiro, assumiu a missão histórica de investir em ciência e inovação de forma concreta, com resultados que chegassem ao coração das pessoas. “Sabemos que a ciência sozinha não caminha. Ela precisa de políticas públicas responsáveis, de recursos financeiros e da união entre governo, universidades, hospitais e sociedade civil”, ressaltou. Entre as ações de apoio da FAPERJ, Caroline destacou o financiamento de grande porte direcionado do edital Fronteiras da Ciência e o apoio ao setor de transplantes de órgãos do Hospital Pedro Ernesto. “Cada transplante realizado é a vitória da vida sobre a doença”, disse Caroline, que também destacou o papel importante e a solidariedade das famílias, que mesmo em um momento de dor profunda, escolhem salvar a vida de outra pessoa.

O secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação parabenizou os médicos e pesquisadores pelos trabalhos que realizam na área de transplantes e colocou a FAPERJ à disposição do setor. “A partir de agora me torno um doador de órgãos”, disse Moraes.

Em seguida, o acadêmico Antônio Braga Neto, diretor da Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Rio de Janeiro, que vem desenvolvendo seus estudos por meio do programa Cientista do Nosso Estado da FAPERJ, lembrou que a história do transplante no País muito se deve ao estado do Rio de Janeiro. Destacou a importância do biólogo Peter Brian Medawar, nascido em Petrópolis, que ganhou o Prêmio Nobel de Medicina em 1960 por descobrir os princípios da tolerância imunológica adquirida, fundamental para entender o mecanismo de rejeição de órgãos transplantados. Ele discorreu sobre como funcionam os diversos programas de apoio da FAPERJ, que já financiou 240 projetos e concedeu 389 bolsas a pesquisas relacionadas a transplantes, além de apoiar editais temáticos que se relacionam ao tema e modernizar e ampliar a infraestrutura de hospitais e laboratórios que apoiam a atividade no estado do Rio de Janeiro. “Precisamos chegar a quem precisa”, afirmou.

“Onde estamos e onde precisamos chegar” foi o tema abordado pelo cardiologista pediátrico Alexandre Cauduro, diretor-geral da Central Estadual de Transplantes do RJ. “Os números são positivos, mas a luta é constante para dar acesso a quem precisa”, disse, reconhecendo que o Programa Estadual de Transplantes deu um impulso na atividade no estado, tornando o transplante mais acessível à população, mas que a média estadual é de 23 doadores por um milhão de habitantes, enquanto no estado de Santa Catarina, por exemplo, é de 45 doadores por milhão. Cauduro também apresentou o ranking de hospitais que mais realizam transplante no estado, liderado pelo Hospital Municipal Adão Pereira Nunes, Hospital Estadual Getúlio Vargas e Hospital Geral de Nova Iguaçu.

A presidente da FAPERJ, que já passou por um transplante de fígado, destacou o papel dos cientistas fluminenses para o avanço dos transplantes no estado, e a importância da conscientização social sobre a necessidade da doação de órgãos (Foto: Paula Guatimosim)

O médico destacou a importância da educação continuada das equipes, baseada no modelo espanhol (também adotado por Santa Catarina), com a oferta de cursos de capacitação sobre as diversas etapas do processo de doação de órgãos. Esse aperfeiçoamento da abordagem e convencimento das famílias em doar órgãos de seus familiares fez com que a taxa de negação caísse de 50% para 27%. Cauduro disse que muitas famílias têm dificuldade de entender a morte encefálica, e acreditam que a morte só ocorre com a parada do coração. Mas a parada cardíaca impede que o coração seja aproveitado para doação e pode ser um complicador inclusive para a preservação de outros órgãos. Segundo Cauduro, os órgãos mais transplantados no Rio de Janeiro são rim e fígado, sendo que em 2024 foram realizados 591 transplantes de rim. Só no primeiro semestre de 2025 foram realizados 5.175 transplantes de diversos órgãos, mas o estado possui 9.413 pacientes em diálise. Já quem precisa de córnea aguarda de quatro a cinco anos na fila.

Chefe do Serviço de Cirurgia Abdominal e Transplante Hepático do Hospital Adventista Silvestre, Eduardo Fernandes destacou os avanços técnicos do transplante, como o transplante intervivos e multivisceral, a máquina de perfusão (equipamento que funciona como um coração e pulmão artificiais e aumenta a viabilidade do órgão) e o transplante oncológico, que utiliza células-tronco no tratamento. Em sua apresentação, Fernandes mostrou vários exemplos de transplantes bem-sucedidos, inclusive de órgãos múltiplos. O médico chamou atenção para o que considera a “epidemia do século”, a obesidade, causadora de diversas doenças, como a esteatose hepática e a cirrose, e concluiu ressaltando a necessidade de se estimular jovens médicos a trabalharem com transplantes.

Primeira médica a realizar um transplante de rim no Hospital Geral de Bonsucesso, onde ajudou a criar o programa de transplante renal, Deise Monteiro de Carvalho é a médica responsável pelo maior número de transplantes realizados na história do Rio de Janeiro. Com uma bagagem de mais de dois mil transplantes realizados, ela traçou uma linha do tempo, lembrando que o primeiro transplante de rim realizado no Brasil ocorreu em 1964, no Hospital dos Servidores do Estado (HSE) do Rio de Janeiro. O paciente, de 18 anos, recebeu o rim de uma criança, mas veio a óbito posteriormente. Segundo ela, outro marco foi o ano de 1986, quando foi criado o Programa Integrado de Transplante de Órgãos (Pito), e instituída a fila única. Este ano também marcou a criação da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Onze anos mais tarde, em 1997, ela considera que foi iniciada uma fase mais profissional, com a criação do Sistema Nacional de Transplante (SNT), com a lista unificada nacional.

Na trilha da popularização do transplante e sensibilização de doares, a acadêmica relembrou o Carnaval de 2003, quando a escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel levou para a avenida o enredo "Para Sempre No Seu Coração - Carnaval da Doação", celebrando a doação de órgãos e o transplante. Outro marco importante para a médica foi em 2010, quando foi criado o Programa Estadual de Transplantes (PET) no Rio de Janeiro. Em 2013, segundo ela, o Hospital São Francisco passa a ser uma nova referência entre os 21 outros hospitais credenciados, tendo realizado quase 600 transplantes de rim até hoje. Segundo a médica, 800 milhões de pessoas são doentes renais em todo o mundo, sendo que no Brasil eles chegam a 10 milhões. Ele lembrou que no País há mais de 10 mil pacientes em diálise, dos quais apenas 1658 na fila do transplante renal. A Dra. Deise afirmou que o custo-benefício do transplante é muito superior ao do tratamento com diálise, além de ser ecologicamente correto, reduzindo o uso de água e o descarte de plástico. “Transplante não é cura, é tratamento”, afirmou Deise, ressaltando que o acompanhamento de pacientes e os cuidados pós-cirurgia ainda representam um gargalo no País. Para ela, a doença renal pode se tornar uma epidemia no futuro.

Na sequência, o cirurgião cardiovascular e acadêmico Alexandre Siciliano, do Instituto Nacional de Cardiologia (INC), atribuiu à estruturação do INC o crescimento sustentável dos transplantes de coração no Rio de Janeiro. Destacou que 46% dos transplantados no estado têm hoje uma sobrevida de 10 anos, muito próximo da média nacional de 50%. Ele acredita que esse sucesso se deve ao crescimento e treinamento das equipes de cirurgiões cardiovasculares, que passaram de apenas uma em 2012 para seis em 2025. Único hospital público que realiza transplantes cardíacos no estado do Rio de Janeiro, o INC é o segundo centro que mais realiza cirurgias de cardiopatias congênitas no Brasil e realiza 100% dos transplantes em crianças. Siciliano contou um dos casos de doação que emocionaram os brasileiros. Trata-se do técnico da equipe alemã de canoagem Stefan Henze, que faleceu durante as Olimpíadas de 2016 no Rio decorrente de um traumatismo craniano em um acidente de automóvel e a família doou seu coração.

Ao fazer um panorama do transplante de pâncreas no Rio de Janeiro, o cirurgião Pedro Túlio Rocha, do Hospital São Lucas, chamou a atenção para o agravamento do problema da obesidade e da diabetes no Brasil. O médico lembrou que a Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, é referência em transplante de pâncreas, no Brasil foi o Hospital Silvestre o pioneiro neste tipo de transplante, tendo realizado 68 transplantes de pâncreas isolado. Segundo ele, o início do Programa Estadual de Transplantes do RJ ajudou a viabilização de 66 transplantes de pâncreas-rins, mas, segundo ele, falta maior participação do estado para aumentar o número de cirurgias, já que o valor pago pelo SUS é insuficiente para remunerar a cirurgia.  

Na parte da tarde, a importância da inovação para os transplantes foi tema da apresentação do médico Luís Cristóvão Porto, doutor em Biologia Humana pela Université Claude Bernard-Lyon (França) e coordenador do Laboratório de Histocompatibilidade e Criopreservação do Núcleo Tecnológico em Reparo Tecidual e Histocompatibilidade da Uerj. “Hoje não se vive sem a inovação na área de transplante”, afirmou. Em sua palestra, ele informou que as ferramentas de busca na internet resultaram em 363 publicações para a palavra transplante, mas também outras tantas ligadas a métodos, terapias e células-tronco. Outras áreas que apresentam avanços e devem ser destacadas, na sua opinião, são as células hematopoiéticas (que dão origem a todos os tipos de células do sangue e do sistema imune), o condicionamento dos pacientes para o transplante, a evolução dos procedimentos cirúrgicos, a preservação dos órgãos e a descoberta de novos biomarcadores para auxiliar no tratamento dos pacientes. Tudo isso com a ajuda da Inteligência Artificial e o Aprendizado de Máquina. 

Porto discorreu ainda sobre a histocompatibilidade (compatibilidade entre células, tecidos ou órgãos de diferentes indivíduos) de antígenos e de gens, fundamental para a realização de um transplante, lembrando que mesmo entre irmãos apenas 25% têm compatibilidade de genes, mas explicou que a medicina regenerativa vem abrindo novos caminhos a partir das pesquisas com células HLA (sistema de antígenos leucocitários humanos). Ele informou que na Uerj os pesquisadores estão formando um biobanco de células, a partir de seis diferentes linhagens, capazes de atender a 64% da população.

O cirurgião Ronaldo Esmeraldo, chefe do Serviço de Transplante Renal do Hospital Geral de Fortaleza (CE), compartilhou sua experiência à frente da unidade, que já realizou mais de três mil transplantes. Ele explicou as diferenças de transplantes de rim de Doador Falecido (DF) e Doador Gratuito Falecido (GDF). Estes são doadores de órgãos que não têm um parente ou amigo específico aguardando um transplante, ao contrário dos Doadores Falecidos. Esmeraldo contou ainda que o Governo do Ceará investiu na estruturação da Central de Perfusão Hipotérmica do Hospital Geral de Fortaleza, a primeira da América Latina, composta por seis máquinas.

Os fundamentos da Manutenção Clínica do Potencial Doador Falecido foi tema da apresentação do diretor da Central Estadual de Transplantes do Estado do Rio de Janeiro, Alexandre Cauduro. Segundo o médico, que se baseou em aula do professor Glauco Westphal, o processo de morte encefálica provoca uma tempestade simpática que pode comprometer todos os órgãos a serem doados para o transplante, devido à falta de oxigenação. Por isso, esclarece que a principal preocupação com o doador é manter os níveis de oxigênio estáveis.

Cauduro esclareceu que as equipes utilizam o protocolo VIP (ventilação, infusão e pressão) para manter as condições adequadas dos pulmões, por exemplo. No caso de doadores com diabetes insipidus, há possibilidade de combater a doença com hormônios antidiuréticos. Nos transplantes de coração, Cauduro sugere a realização de ecocardiograma para avaliação da contratilidade ventricular de preferência 24 horas após o óbito. Já no caso de paciente falecido devido à sepse ou infecção, a administração de antibióticos associada ao protocolo VIP aumenta a viabilidade dos órgãos. Até mesmo no caso de parada cardíaca, o médico aponta para formas de aproveitamento dos órgãos sólidos e no futuro, até mesmo o próprio coração, no caso de pacientes que venham a óbito no Centro de Tratamento Intensivo (CTI), que já estejam monitorados.

A parte final do seminário emocionou a todos, com depoimentos de transplantados e familiares de doares. Com uma energia invejável, a empresária do comércio varejista Regina Helena de Oliveira, contou que se tornou paciente renal aos 31 anos, perdeu um rim e passou a depender de hemodiálise. Após um ano, perdeu o outro rim e conseguiu fazer o transplante com o cirurgião Lucio Pacheco. Foram 19 anos de hemodiálise, enfrentando todas as dificuldades e consequências do tratamento, o que não a impediu de viajar pelo mundo e pelo Brasil. Foi apenas no início de 2024 que ela conseguiu outro doador compatível e pôde fazer o segundo transplante. Já Heloisa Helena Barbosa foi trazida de Três Rios, munícipio localizado a 125 km ao norte da capital, para dar seu depoimento, pois quando o assunto é transplante bem-sucedido, Heloisa é garota-propaganda. Ela precisou fazer um transplante renal com apenas 18 anos e hoje, 50 anos depois, já passou por cirurgia para a retirada de um câncer no outro rim. Com 47 anos dedicados ao ensino e à pesquisa na Uerj – cinco como aluna, 42 como docente – recebeu em 2024 o título de Professora da Faculdade de Direito.

Já os irmãos Alexandre e Eduardo da Silva Cardoso se emocionaram ao descrever o doloroso processo de acatarem o último desejo de sua mãe, Selma Maria, de ajudar o próximo mesmo após sua morte. Foram quatro dias até que os irmãos, orientados pela enfermeira Cândida, no Hospital de Tanguá, entenderam o que significava a morte encefálica. Eles apresentaram um vídeo gravado no hospital e a música "Como É Grande o Meu Amor Por Você", de Roberto Carlos, que a mãe sempre cantava para eles.

Por último, “O reverso da medalha: a visão do cirurgião transplantador como transplantado” foi o depoimento do médico Lúcio Pacheco. Chefe de transplantes hepáticos dos hospitais Quinta D’Or e Barra D’Or e com a experiência de mais de 1400 transplantes de fígado realizados, sendo pioneiro no transplante intervivos com monosegmento (pediátrico), Lucio contou que nunca havia passado pela sua cabeça a possibilidade de um dia necessitar de transplante. Foi um exame de sangue de rotina durante a pandemia de Covid-19 que revelou o câncer no fígado. Enquanto o número normal do marcador tumoral é 10, e o dele estava em 10 mil. A notícia foi dada por sua esposa, a hepatologista Elizabeth Balbi, que também integra a sua equipe. Pacheco conta que precisou iniciar quimioterapia, para baixar o marcador tumoral, e na dúvida sobre quem deveria fazer sua cirurgia de transplante foi surpreendido por sua instrumentadora, que elogiou a capacidade de sua equipe, cujo integrante mais velho tinha apenas 39 anos. Foram vários dias conversando com a equipe e alertando para as complicações possíveis, uma vez que ele possuía uma trombose. A cirurgia de transplante foi um sucesso. Apesar de, no pós-operatório, ter precisado tomar 19 medicações diferentes, com um mês e 20 dias de transplantado já estava operando de novo. “Se hoje estou vivo foi porque uma família disse sim à doação”, finalizou.

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