Linguagem Libras Facebook X Intagram YouTube Linkedin Site antigo
logomarca da FAPERJ
Compartilhar no FaceBook Tweetar Compartilhar no Linkedin Compartilhar no Whatsapp Compartilhar no Email Imprimir
Publicado em: 13/04/2022 | Atualizado em: 13/04/2022

Livro lança reflexão sobre a construção da memória coletiva

Débora Motta

Livro coloca em debate as relações de poder no processo de construção da memória coletiva (Foto: Luiz Baltar)

A História é contada a partir da percepção dos fatos, que está ligada à visão de mundo do narrador, com seu arcabouço de valores e interesses sociais, políticos e culturais. Nos últimos anos, no estudo dessa disciplina, as narrativas da historiografia oficial vêm sendo contrapostas às memórias coletivas associadas a testemunhos e autobiografias, que revelam versões dos fatos não autorizadas pelo discurso dominante. Para discutir as relações de poder perpetuadas na construção da memória coletiva, a historiadora Myrian Sepúlveda dos Santos, que é professora titular na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), organizou o livro Entre utopias e memórias: arte, museus e patrimônios. A obra é fruto dos seus estudos desenvolvidos com apoio do programa Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ, e foi lançada pela Mórula Editorial (https://morula.com.br), em evento realizado na última quinta-feira, 7 de abril, na livraria Folha Seca (Rua do Ouvidor, 37, Centro, Rio).

Myrian explicou que antigamente a historiografia oficial era repleta de heróis e mitos, e isso era reproduzido em um discurso sem questionamentos, que acabou por muitos anos moldando a memória coletiva. “Hoje, há um movimento para se repensar o que era ensinado na historiografia oficial. Não se fala mais em ‘descoberta’ do Brasil, e sim da chegada dos europeus. Não se deve interpretar mais a Princesa Isabel como a salvadora abolicionista, pois a abolição ocorreu devido à resistência e ativismo de outros grupos sociais, como os quilombolas, que foram protagonistas nesse processo”, explicou. “O Monumento às Bandeiras, em São Paulo, é um exemplo de como os bandeirantes eram representados como heróis, segundo a visão da historiografia oficial, apesar do genocídio promovido por eles sobre os povos indígenas originários”, citou.

Ela lembrou que por trás de cada monumento, espaço urbano, nome de rua, de parque, de prédio ou das instituições públicas há representações sociais, que acabam formando a memória coletiva e revelam histórias de dominação e as relações de poder presentes na sociedade. “A escolha dos nomes para os locais públicos nunca é neutra, está repleta de significados e conteúdos políticos. Cada monumento ou escolha de nome para um espaço urbano está relacionada à representação e à imagem que se faz, por exemplo, da cultura afro-brasileira, das memórias da ditadura ou do que é o racismo e o patriarcado”, refletiu.

A autora destaca que as conexões entre direitos e memórias fazem parte dos embates historiográficos do século XXI. Para ela, apontar as narrativas que perpetuam injustiças sociais é um papel importante do historiador. “O historiador deve estar atento a esses conflitos da História, às demandas dos grupos subalternos e dos movimentos sociais. A construção da memória coletiva hoje, quando se relaciona com a historiografia, sempre deve priorizar a justiça social, para não repetirmos os erros do passado”, disse Myrian, que teve a ideia de organizar o livro a partir dos debates promovidos pelo V Seminário Arte, Cultura e Poder, realizado pelo grupo de pesquisa homônimo, liderado por ela, entre maio e junho de 2021.

Myrian Sepúlveda: para ela, apontar as injustiças sociais na construção da memória é dever do historiador (Foto: Divulgação)

O livro é dividido em três partes: I - Descentrando as memórias coletivas, II - Patrimônio em contextos de crise, III - Arte e memórias políticas, IV - Memória coletiva, revisões e políticas antirracistas. “A Parte I fala da importância da construção das memórias coletivas e critica as narrativas oficiais colonialistas. A Parte II analisa a questão do Patrimônio em contextos de crise, incluindo uma abordagem sobre os ‘lugares sensíveis’, que são espaços onde ocorreram fatos traumáticos, como os cemitérios clandestinos onde a ditadura militar escondia as ossadas de vítimas da repressão. A Parte III faz uma interseção entre a Arte e a Memória. Já a Parte IV destaca as políticas de memória para as culturas de matriz africana no Brasil, incluindo a memória dos quilombolas”, resumiu.

Entre utopias e memórias: arte, museus e patrimônios reúne artigos escritos por professores de diversas instituições, com uma abordagem interdisciplinar, que abrange áreas como História, Ciências Sociais, Antropologia, Sociologia, Artes, Comunicação e Literatura. Além de Myrian, assinam os artigos os professores Carlos Gadea, Tereza Ventura, Leopoldo Pio, Adebal de Andrade Júnior, Yussef Campos, Maurício Barros de Castro, Fred Coelho, Tatiane Schilaro, Viviane Borges, Gilvan Barreto, Gabriel Vidal Cid, Luciane de Souza, Joseane Brandão e Lília Abadia.

Ainda como desdobramento das pesquisas desenvolvidas com o apoio do mesmo edital Cientista do Nosso Estado, ela lançou no ano de 2021 a obra Memória Coletiva e Justiça Social, em que investiga as tensões entre História e Memória em diferentes cenários: na luta política de movimentos negros, povos indígenas e quilombolas; nos movimentos por verdade e justiça para as vítimas da ditadura militar; na expressão dessas demandas sociais em museus e memoriais.

Topo da página