Linguagem Libras Facebook X Intagram YouTube Linkedin Site antigo
logomarca da FAPERJ
Compartilhar no FaceBook Tweetar Compartilhar no Linkedin Compartilhar no Whatsapp Compartilhar no Email Imprimir
Publicado em: 10/07/2025 | Atualizado em: 10/07/2025

Caroço do açaí, um remédio natural contra a obesidade

Marina Verjovsky

Considerado um superalimento pelos seus benefícios nutricionais, o açaí ganhou projeção no mercado nacional e internacional nos últimos anos. O consumo crescente gera milhares de toneladas de caroços – e seu descarte correto é um desafio no Brasil, principal produtor no mundo (Foto: Wikimedia/Commons) 

Uma pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) mostrou que o caroço do açaí, um descarte agro, gera um extrato rico em compostos antioxidantes – chamados polifenois –, com grande potencial no combate à obesidade e suas complicações. Ele tem resultados semelhantes à metformina, um medicamento amplamente utilizado para tratar diabetes, mas atua por mecanismos diferentes. 

Considerado um superalimento pelos seus benefícios nutricionais, o açaí ganhou projeção no mercado nacional e internacional nos últimos anos. O consumo crescente gera milhares de toneladas de caroços – e seu descarte correto é um desafio no Brasil, principal produtor no mundo. Segundo o IBGE, foram produzidas 1,6 mil toneladas do fruto no país em 2023. 

O estudo fez parte da tese de doutorado de Bernardo Arnoso e foi publicada na revista Molecular and Cellular Endocrinology. A pesquisa, apoiada pela FAPERJ, foi coordenada pela professora Cristiane Aguiar da Costa, do Instituto de Biologia Roberto Alcântara Gomes da Uerj. 

“Já trabalhamos com esse extrato desde 2007, em diferentes modelos experimentais de obesidade, diabetes e hipertensão, e nossos estudos pré-clínicos têm demonstrado que ele é bastante promissor no tratamento da obesidade", conta Cristiane. "Agora, pela primeira vez, avaliamos a sua ação na saúde intestinal, que é importante no desenvolvimento de doenças crônicas.” Além disso, a equipe também investigou como o extrato influencia a comunicação entre o intestino e o cérebro.

Os experimentos foram feitos em camundongos alimentados com uma dieta extremamente gordurosa, que simula as condições de obesidade e alterações metabólicas em humanos. Eles foram divididos em quatro grupos: um controle com dieta normal, um que recebeu dieta gordurosa, outro que além da dieta gordurosa foi tratado com o extrato, e o último tratado com metformina. Após 10 semanas de dieta, os tratamentos se prolongaram por mais quatro semanas.

Principais resultados

A dieta gordurosa causou danos ao intestino dos animais, incluindo inflamação, estresse oxidativo, redução da capacidade de absorção de nutrientes e alterações na produção de muco protetor. Essas alterações comprometem a barreira intestinal, que atua impedindo a entrada de substâncias nocivas no corpo. Ambos os tratamentos ajudaram a reparar esses danos, embora o extrato do caroço do açaí tenha sido mais eficaz em reduzir a inflamação, enquanto a metformina teve melhor desempenho na restauração das proteínas que mantêm a barreira intestinal unida. 

A pesquisa também mostrou que – como esperado – o consumo excessivo de gordura favorece bactérias associadas à obesidade. Os dois tratamentos ajudaram a restaurar um equilíbrio mais saudável dos micróbios no intestino. No entanto, o extrato foi além, com aumento de substâncias benéficas como os ácidos graxos de cadeia curta, que são importantes para a saúde intestinal e metabólica.  

Ou, mais especificamente, no hipotálamo, a dieta rica em gordura alterou a expressão de genes relacionados à fome e ao metabolismo. O extrato do caroço do açaí e a metformina corrigiram parcialmente essas mudanças, embora tenham agido de maneiras diferentes. Por exemplo, a metformina aumentou a sensibilidade ao hormônio leptina, que regula o apetite, enquanto o extrato elevou os níveis de outros sinais que influenciam a ingestão alimentar.  

Estudo que fez parte da tese de doutorado de Bernardo Arnoso foi publicado na revista Molecular and Cellular Endocrinology. A pesquisa foi coordenada pela professora Cristiane Aguiar da Costa, do Instituto de Biologia Roberto Alcântara Gomes da Uerj (Foto: Divulgação)

Para completar, tanto os grupos tratados com o extrato quanto a metformina tiveram redução significativa no peso corporal e melhora nos níveis de açúcar no sangue. O extrato foi ainda mais eficaz em baixar a glicemia de jejum, um importante marcador de controle metabólico. 

Um futuro promissor

“Esses efeitos são inéditos e importantes, tornando esse produto com grande potencial terapêutico”, declara Cristiane. A pesquisadora acrescenta ainda que o processo de obtenção do extrato é muito simples. “Com certeza pode ser aplicado em grande escala e contribuiria para a diminuição do descarte de caroços no ambiente, minimizando o impacto ambiental”. 

O grupo tem uma patente e o extrato já é comercializado por um laboratório, na forma de suplementos alimentares. Porém, a pesquisadora adverte que para uso medicinal ainda são necessários mais estudos para entender como o composto é distribuído, absorvido e excretado pelo corpo. Isso é importante para determinar dosagens adequadas e avaliar contra-indicações caso sobrecarregue algum órgão, como rins ou fígado. “Ainda temos poucos dados desse tipo, como a dosagem de polifenois no plasma e no leite materno, mas pretendemos ampliá-los e já temos parcerias para começar estudos com humanos em breve".

Em etapas seguintes, o grupo ainda pretende estudar o efeito do extrato do caroço do açaí no pâncreas – já que observam melhoras nos níveis de insulina. Paralelamente, também vão investigar se outros extratos podem ter efeitos na obesidade e diabetes – como as folhas de Alpinia zerumbet, popularmente conhecida como falso-cardamomo, ou colônia,e o própolis verde brasileiro (Baccharis dracunculifolia). “A obesidade é uma doença com grandes desafios, que impacta a saúde pública", acrescenta Cristiane. “Nosso objetivo é desenvolver produtos naturais, de baixa toxicidade, com grande potencial terapêutico e que sejam acessíveis à população”.

Topo da página