Marcos Patricio
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O pesquisador Samuel Bertolini e a bateria com catodo de flúor. O material tem perspectivas de se tornar uma alternativa ao íon-lítio para fabricação de baterias (Foto: Divulgação). |
Um grupo de pesquisa do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense (UFF) está trabalhando em um projeto que pode ser o ponto de partida para o desenvolvimento de uma nova família de baterias. Elaborado a partir de um composto, que mistura poliacrilonitrila (PAN) e teflon, conhecido como PANflon, a bateria de lítio-flúor pode ser uma alternativa mais eficiente, econômica e sustentável às tradicionais baterias de íon-lítio. Apesar de serem utilizadas amplamente em celulares, laptops e automóveis, as baterias de íon-lítio devem ser substituídas por outras famílias de materiais nos próximos 5 a 10 anos.
Diversamente das baterias de íon-lítio, que utilizam materiais como óxidos de cobalto, a bateria de lítio-flúor desenvolvida pelo grupo emprega flúor como material ativo do catodo, ou seja, o flúor é o componente responsável pelo armazenamento e liberação de energia. E o teflon é um polímero com grande volume de flúor. “É isso que torna o desempenho do catodo mais eficiente”, explica Samuel Bertolini, pesquisador visitante do Instituto de Física e coordenador do projeto. Bertolini desenvolveu a pesquisa no Laboratório de Microscopia de Alta Resolução (Lamar) da UFF, que é coordenado pelo professor Yutao Xing.
De acordo com Bertolini, o PANflon é o principal objeto de estudo do projeto, que conta com recursos da FAPERJ, por meio do edital Apoio ao Jovem Pesquisador Fluminense sem Vínculo em ICTs do Estado do Rio de Janeiro. “Essa tecnologia é inédita na ciência dos materiais. Esse é o primeiro passo para o desenvolvimento de uma nova família de baterias”, afirma.
Uma das principais vantagens da bateria de lítio-flúor em desenvolvimento é a sua alta capacidade de armazenamento de energia. Enquanto a capacidade das baterias de íon-lítio gira em torno de 140 mAh/g, o produto à base de PANflon apresentou uma surpreendente evolução. No início dos testes, a capacidade era de apenas 30 mAh/g, mas após ciclos de carga e descarga ela superou os 1.000 mAh/g, ou seja, oito vezes mais do que os modelos tradicionais. Depois de alguns meses de testes, a equipe do Instituto de Física conseguiu aumentar a capacidade já nos ciclos iniciais. “Um dos desafios do projeto foi justamente dominar os motivos que levaram ao crescimento da capacidade de armazenamento. Já conseguimos entender, dentro do processo, como obter uma capacidade alta já nos primeiros ciclos. Já conseguimos, também, aumentar esses valores”, explica Bertolini, doutor em Engenharia e Ciência dos Materiais pela Texas A & M University.
Segundo o pesquisador, ainda é preciso testar a bateria em várias condições. “Temos que testar uma amplitude grande de correntes para ter uma noção de como se estabelece a capacidade da bateria. Ainda falta avaliar a longevidade dessa bateria. A gente sabe que ela tem estabilidade e uma capacidade alta já nos primeiros ciclos. Agora falta descobrir se é uma vida curta ou longa. Ainda não foi possível fazer isso, porque cada ciclo que a gente consegue fazer demora em torno de dois ou três dias. Para fazer esse tipo de exame eu preciso de 500 ou 1.000 ciclos. Então, isso é praticamente uma pesquisa de três anos. Vamos tentar fazer isso de forma mais rápida aumentando a corrente”, adianta Bertolini.
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A partir da esquerda: Samuel Bertolini, Sofia Borges, Gabriel Vinhático e o professor Yutao Xing. Parte da equipe que participou do projeto reunida no Laboratório de Microscopia de Alta Resolução da UFF (Foto:Divulgação/Derick Evangelista). |
A nova bateria de lítio-flúor também apresenta um custo de produção inferior ao das baterias de íon-lítio, o que é um outro atrativo do projeto. “Isso pode tornar a bateria de PANflon mais acessível e facilitar sua utilização em uma ampla gama de aplicações. De equipamentos eletrônicos a veículos”, argumenta o pesquisador, que retornou ao Brasil no fim de junho, depois de passar dois meses realizando um outro projeto na Universidade Católica de Louvain, na Bélgica. De acordo com Bertolini, o novo produto poderá ser aplicado em conjunto com baterias à base de sódio e magnésio, materiais mais abundantes e mais baratos do que o lítio.
Outra vantagem é o fato de o PANflon ser mais sustentável do que outros compostos utilizados até o momento o que reduz o impacto ambiental. “O material foi patenteado. Seu modo de uso está protegido. Esperamos que até o fim de 2025, os resultados da pesquisa sejam publicados em uma revista de fator de impacto relevante”, explica o pesquisador. “Demos continuidade aos estudos e, recentemente, conseguimos desenvolver um novo material, que apresenta outras vantagens em relação aos demais e possivelmente também será patenteado”, adianta Bertolini.
O pesquisador utilizou os recursos da FAPERJ para aquisição de equipamentos para o desenvolvimento do projeto, o que resultou na criação de um pequeno laboratório. O primeiro dedicado a energias renováveis no Instituto de Física da UFF. Nele, os pesquisadores poderão aprimorar os estudos e, quem sabe, desenvolver compostos para novas aplicações.