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Publicado em: 23/01/2023 | Atualizado em: 23/01/2023

Livro apresenta o protagonismo feminino nas favelas cariocas

Paula Guatimosim

Essas são algumas das lideranças de comunidades entrevistadas ou com perfil publicado no livro da prof. Nilza Rogèria Nunes (Fotos: Divulgação)

Uma reflexão sobre o protagonismo das mulheres nas favelas cariocas. Essa é a proposta do livro Mulher de favela: experiências compartilhadas, que acaba de ser lançado pela Editora PUC-Rio. O título é um desdobramento da extensa pesquisa nomeada “Determinantes sociais da saúde em debate: um estudo sobre a atuação de lideranças femininas nas favelas do Rio de Janeiro”. Coordenado pela professora do departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Nilza Rogéria Nunes, o estudo teve o objetivo de identificar e dar visibilidade às múltiplas formas de enfrentamento das iniquidades através dos saberes e das práticas locais protagonizadas pelas mulheres que exercem liderança nas favelas do Rio de Janeiro.

Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) no final dos anos 1980, Nilza sempre trabalhou em comunidades. Mas foi no final do curso de mestrado em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social pela UFRJ que passou a se interessar mais pela participação das mulheres, o que logo despertou seu interesse pelas lideranças femininas. No curso de doutorado em Serviço Social na PUC-Rio, Nilza construiu sua Tese a partir das perguntas: “o que é ser mulher, o que é ter poder e o que ser mulher e ter poder na favela”. As respostas dessas lideranças mostraram que mulher de favela não necessariamente mora, mas fundamentalmente atua em defesa de um projeto de cidade, mas com uma escolha radical pelo território da favela.

O livro é fruto de entrevistas com 200 mulheres líderes em 169 favelas do Rio de Janeiro

O livro está disponível para download gratuito em pdf neste link. É fruto de entrevistas com 200 mulheres de 169 favelas do Rio, que de alguma forma são protagonistas em suas comunidades. Desse universo de entrevistadas, 149 foram perfiladas com imagens no livro, revelando suas lutas sociais e políticas, que extrapolam as favelas, ganhando a cidade. Dividida em duas partes, a obra tem prefácio da canadense Anne-Marie Veillette, que há seis anos veio cursar mestrado e posteriormente o doutorado no Brasil e se tornou parceira de Nilza em vários estudos. A primeira parte do livro apresenta as oito entrevistas com mulheres negras que travaram lutas anteriores aos anos 1980. A segunda parte traz um mapeamento e 200 mulheres reconhecidas como lideranças, ativistas comunitárias ou mulher de favela.

Para realizar seu trabalho, Nilza contou com o apoio fundamental das bolsistas de Iniciação Científica da FAPERJ Letícia Matos da Silva, Julia Inácio Cabral, Maria Madalena Letícia Bezerra Paiva e Tainã Silva Mariano, e das bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Carolina Sthefany Cordeiro e Vania Mauricio Mendonça da Silva. Nilza também recebe apoio da FAPERJ para a realização de seus estudos por meio do programa de fomento à pesquisa Jovem Cientista do Nosso Estado. Ela teve aprovado pela Fundação, em março de 2022, o projeto Lideranças femininas nas favelas e periferias e as estratégias para o enfrentamento das consequências da Covid-19”.

Entre as lideranças entrevistadas está Lúcia Cabral, do Complexo do Alemão, que no lançamento do livro falou sobre o trabalho de Nilza: “A gente se identifica e se completa. Você é a linha que tece a rede com cuidados para que os tecidos (nós) sejam um encaixe em harmonia e que transmitam saberes entre pares”. Na ocasião, também se conheceram a liderança mais idosa, D. Zica (Anazir Maria de Oliveira), 89 anos, pedagoga, pós-graduada em psicopedagogia, assistente social e liderança comunitária da Vila Aliança, em Bangu; e a mais nova, Lua (Raissa Luara Castro de Oliveira), de 15 anos, moradora da Ladeira dos Tabajaras, que já estruturou 64 bibliotecas comunitárias em cinco estados brasileiros. “A potencia dos trabalhos das mulheres é intergeracional”, afirma Nilza, que georreferenciou todas as entrevistas.

O gráfico mostra a atuação das lideranças entrevistadas: a maioria atua na área da educação e no conceito ampliado de promoção da saúde (Reprodução)

"A favela: lugar de pertença e de suas agências" é o título do capítulo que traça um panorama sobre conceito, nomenclaturas, distribuição e evolução das favelas no Rio de Janeiro. Em seguida, em “Quem são as mulheres de que estamos falando” mostra o percurso pessoal e coletivo das oito entrevistadas, com idade entre 60 e 85 anos e há mais de 40 anos nas favelas. Na sequência, em “Mulheres de favela, quem são vocês?” revela, a partir de diversos mapas e tabelas, a distribuição espacial das entrevistadas, predominância de raça/cor, escolaridade, renda, religião, dados sobre família e relacionamento e início da atuação, entre outras. A pesquisa também revela que 65% são vinculadas à Organizações Governamentais (ONGs) ou Organizações Sociais Comunitárias, 73% atuam em rede, 66,7% militam em movimentos comunitários, a maioria atua na área da educação e na promoção da concepção ampliada de promoção da saúde e o mais grave: 53,7% já sofreram algum tipo de ameaça à integridade devido à atividade.  

Nilza Nunes: projeto coordenado por ela dá visibilidade a lideranças femininas em favelas do Rio

Inspiração para essas lideranças, Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018, mereceu um espaço na página 55, que reproduz trecho de sua fala na Câmara Municipal do Rio de Janeiro: Ainda que ganhemos salários menores, que estejamos em cargos mais baixos, que passemos por jornadas triplas, que sejamos subjugadas pelas nossas roupas, violentadas sexualmente, fisicamente e psicologicamente, mortas diariamente pelos nossos companheiros, nós não vamos nos calar: as nossas vidas importam! […] Do nosso corpo que fala, da nossa cor que fala, da nossa raça que fala, do nosso gênero que fala […] A gente tá ativa, tá militando, tá resistindo!

A sinergia do grupo é tanta que elas criaram um grupo de 148 mulheres no whatsapp para trocarem mensagens, conhecimento, informações. “Fico feliz, pois é o desdobramento da pesquisa, a formação de uma rede de estratégias comunitárias, de sinergias, a organicidade das mulheres que trazem essa pauta para si”, diz a professora Nilza, que garante aprender mais com esses saberes do que ensinar.

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