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Publicado em: 02/06/2022 | Atualizado em: 02/06/2022

Bióloga cria empreendimento para gerir resíduos sólidos e garantir remuneração a cooperativas

Paula Guatimosim

Na Teiares, Hanna (esq.) promove uma economia circular mais justa e de impacto social positivo

A bióloga Hanna Schneider Rodrigues nasceu no Rio de Janeiro, mas, até os 15 anos, residiu entre Angra dos Reis e Paraty, municípios da Costa Verde, no litoral sul do estado do Rio de Janeiro. Ingressou na faculdade de Biomedicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e, após dois anos de curso, foi contemplada com uma bolsa de estudos para intercâmbio na Alemanha, onde, após o término da bolsa, cursou Biologia na Universidade Técnica de Munique, tendo se formado em 2012. Ao retornar para o Brasil, após participar de alguns processos seletivos na área ambiental, iniciou sua carreira na área gestão de resíduos sólidos. Por ter atuado como supervisora de campo de um programa de reciclagem de uma grande empresa de refrigerantes, teve contato direto com as cooperativas de catadores, tendo se envolvido muito com a categoria.

Foi vivenciando a realidade e as dificuldades das cooperativas de catadores, ao longo de dois anos, que passou a defender a remuneração da categoria pelo serviço prestado. “Aprendi muito com este convívio, mas tive a certeza de que trabalhar a questão social dessas cooperativas era primordial”, recorda a bióloga. Devido a essa experiência, em 2015 foi convidada para trabalhar na Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (Comlurb), no Programa de Ampliação da Coleta Seletiva, onde exercia a importante função promover um diálogo direto entre os interesses dos catadores e do poder público. Ali ela também atuou diretamente na operacionalização da Coleta Seletiva instituída pela companhia e na destinação dos materiais recicláveis coletados pelos 16 caminhões da Comlurb.

A atenção dos organizadores de grandes eventos com a gestão correta dos resíduos abriu outra oportunidade de trabalho para Hanna. Assim, em 2016, ela atuou como gerente adjunta de resíduos sólidos na Vila Olímpica e Paraolímpica, durante as Olimpíadas. Ela também participou da gestão de resíduos sólidos do Rock In Rio (2013, 2015, 2017 e 2019), do Carnaval (2014 e 2018) e do Réveillon (2013). Atualmente, Hanna ainda presta consultoria para a Cooperativa Popular Amigos do Meio Ambiente (Coopama), localizada em Maria da Graça, bairro da Zona Norte do Rio, como técnica de projetos. Ali nasceu a ideia da Teiares. Em 2018, Hanna participou do Programa de Empreendedorismo Shell Iniciativa Jovem, mesmo ano em que foi contemplada no Programa de Apoio ao Empreendedorismo de Impacto Socioambiental do RJ, da FAPERJ, e deu início à Teiares Serviços em Gestão e Sustentabilidade.

Uma das motivações de Hanna (centro) para empreender foi a busca de uma forma justa de remuneração das cooperativas de reciclagem

“Uma das motivações que me levaram a empreender foi a busca de uma forma adequada e justa de remuneração das cooperativas de reciclagem. A maioria delas não tem sustentabilidade financeira e sobreve da venda de resíduos”, explica a bióloga. Segundo ela, grande parte dos resíduos que chega às cooperativas vem dos caminhões de coleta seletiva da Comlurb, que, por sua vez, coleta o que não foi recolhido pelos catadores autônomos.  Hanna explica que a crise econômica e o alto índice de desemprego decorrente da pandemia da Covid-19 aumentou o número de catadores de rua, que, muitas vezes, viam no lixo sua única fonte de renda. Essa atividade paralela, segundo ela, afetou a atividade das cooperativas.

Para garantir que as cooperativas continuassem tendo resíduos para reciclar, a empreendedora visualizou o ciclo completo e decidiu envolver a fonte geradora de lixo. Hanna abordou restaurantes e conseguiu convencer alguns que o custo-benefício da destinação dos resíduos para reciclagem era positivo. “O serviço que ofereço inclui a sensibilização para o problema e a troca de informações”, esclarece. Dos dois clientes iniciais em 2018, atualmente, a Teiares possui 17, a maioria restaurantes, mas também há dois hotéis e um escritório. De uma empresa de coleta de lixo comum, foi para três, e incluiu mais duas iniciativas entre os parceiros fixos: a Cooperecológica, de Jardim Gramacho, no município de Duque de Caxias; e a VideVerde, para a coleta de resíduos orgânicos, uma demanda que partiu de um dos restaurantes atendidos.

“Após muito aprendizado, como acontece com todos que empreendem sozinhos”, Hanna deu início a uma sociedade com a engenheira eletrônica, mestre em Engenharia Urbana e especialista em Gestão Ambiental Claudia Khair, que há algum tempo colaborava com seu projeto. Durante a pandemia do Sars-Cov2 a Teiares também passou a oferecer serviço de coleta de resíduos sólidos em condomínios e domicílios e hoje atende a um condomínio e 25 residências.

A Teiares ajuda a promover uma Economia Circular mais justa, sustentável e participativa, gerando impacto social em cooperativas de catadores. O serviço inclui - além da implantação de coleta seletiva - palestras e treinamento e monitoramento dos indicadores. “Treinamos os cooperados e fazemos questão de levar os clientes nas cooperativas para que eles possam conhecer aquela realidade”, diz Hanna. Os resíduos recicláveis são destinados às cooperativas, que são remuneradas pelo serviço prestado. Já os resíduos orgânicos são destinados à compostagem. Segundo a bióloga, o lixo não passível de reciclagem ou compostagem são rejeitados, “pois o que não tem jeito, vai pro rejeito".

Apenas 10% dos catadores brasileiros estão formalizados em algum grupo de trabalho, como cooperativas ou associações

No Brasil, 90% dos resíduos encaminhados à indústria recicladora passam pelas mãos de catadores de materiais recicláveis. Apenas 10% dos catadores estão formalizados em algum grupo de trabalho, como cooperativas ou associações; 11% dos catadores com mais de 25 anos possuem ensino médio completo, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); e 66% dos catadores do Estado do Rio deixariam de ser catadores se tivessem outra oportunidade.  São essas pessoas que cuidam dos materiais recicláveis e que, muitas vezes, garantem que os recursos naturais retornem ao ciclo produtivo. “E por mais contraditório que possa parecer, são também essas pessoas as menos valorizadas pela nossa sociedade e as que mais sofrem com uma gestão inadequada dos resíduos”, esclarece Hanna. Para ela, essa injustiça social se perpetua a partir de um ciclo vicioso, em que populações em situação de vulnerabilidade social têm seus direitos e suas vozes silenciadas, o que acaba por perpetuar e reafirmar a desigualdade social.

Na opinião da bióloga, o Rio de Janeiro regrediu na política de gerenciamento de resíduos sólidos. Não há campanha de Educação Ambiental efetiva para sensibilizar os cidadãos, a Comlurb reduziu a coleta seletiva e o tamanho dos caminhões, o desemprego aumentou a informalidade e o número de catadores e a quantidade dos resíduos que chega às cooperativas formalizadas diminuiu. Para ela, a economia circular é o único caminho para um futuro melhor; e nessa complexa cadeia circular, cada etapa tem sua importância e cada um o seu valor. “Reconhecer o trabalho dessas pessoas é o primeiro passo para garantir a regeneração do planeta”, acredita Hanna.

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