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Publicado em: 10/12/2020 | Atualizado em: 29/12/2020
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Constantino Tsallis: a Física brasileira bem representada

Débora Motta

Autor da 'Estatística de Tsallis', o físico é o pesquisador brasileiro
com o segundo maior número de citações nominais em artigos
científicos, depois do sanitarista Carlos Chagas
 
(Foto: Divulgação) 

Reconhecido como um dos físicos brasileiros de maior projeção internacional, o pesquisador emérito do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) Constantino Tsallis tem mais uma realização a comemorar. Seu nome foi destacado recentemente entre os 160 mil cientistas “mais influentes” do mundo, em ranking publicado no periódico científico PLOS Biology (mais precisamente, a lista contém 159.684 nomes em todas as áreas cientificas). O artigo, que tem como autor principal John Ioannidis, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, é assinado em conjunto com dois autores, um americano e outro holandês, foi publicado com o título Updated science-wide author databases of standardized citation indicators e já totaliza 384.396 visualizações ao redor do mundo. A tabela reúne pesquisadores de 22 áreas e 176 subáreas científicas, que se destacaram segundo os bancos de dados utilizados, até 2019. Para o estudo foram usadas as citações da base de dados Scopus, que atualiza a posição dos cientistas em dois rankings: o impacto do pesquisador ao longo da carreira (Tabela-S6-career-2019); e o impacto do pesquisador em um único ano, neste caso o ano de 2019 (Tabela-S7-singleyr-2019). Citados na Tabela-S6-career-2019, há aproximadamente 600 brasileiros, e, dentre estes, o nome de Tsallis (1.660, na classificação geral) aparece em segundo lugar. Na verdade, se considerados apenas os pesquisadores com cidadania brasileira de fato, seu nome fica na primeira posição. Curiosamente, o indicado pelo algoritmo computacional que elaborou a pesquisa para liderar o ranking foi o geofísico holandês van Genuchten, que foi professor visitante na Universidade Estadual Paulista (Unesp) e trabalha na Universidade de Utrecht, na Holanda.

Autor da teoria conhecida como “Estatística de Tsallis”, o físico é o pesquisador brasileiro com o segundo maior número de citações nominais (quando um outro cientista menciona seu nome no título ou no resumo de um trabalho, por exemplo). Ele tem 3.602 citações nominais - atrás apenas do pioneiro médico sanitarista Carlos Chagas, descobridor da doença homônima, que possui 21.599 citações nominais. Em termos de comparação, na Web of Science, Einstein tem 83.541 citações nominais, enquanto o químico Ilya Prigogine, ganhador do Prêmio Nobel, tem 1.713. Fundador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Sistemas Complexos, que coordenou por oito anos, Tsallis tem uma sólida vida acadêmica dedicada à pesquisa e docência no CBPF, onde leciona Mecânica Estatística, nos cursos de pós-graduação em Física. Ele vem desenvolvendo diversos projetos de pesquisa ao longo de sua extensa carreira, tendo sido contemplado pela FAPERJ por meio do programa Cientista do Nosso Estado e, atualmente, com a bolsa de Pesquisador Visitante Emérito.

Nascido na Grécia em 1943, ele emigrou para o Brasil com apenas quatro anos. Logo, a família se transferiu para Mendoza, na Argentina, onde completou seus estudos primários e secundários. Diplomado pelo Instituto de Física de Bariloche em 1965, seguiu para a Europa no ano seguinte após obter uma bolsa de estudos do governo francês. Durante quase uma década na França, lecionou Física regularmente na Universidade de Paris e na École de Physique et Chimie de Paris, onde trabalhou Madame Curie. Em 1974, recebeu o diploma de Docteur d'État ès Sciences Physiques pela Universidade de Paris-Orsay, por pesquisas na área de Teoria dos Fenômenos Críticos. Em 1975, se estabeleceu novamente no Brasil, e obteve a nacionalidade brasileira em 1984. Durante sua vida profissional, foi laureado com os títulos de Doutor Honoris Causa por diversas instituições, como a Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina, Universidade Estadual de Maringá, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade Aristotélica de Tessalônica, na Grécia, e foi homenageado ainda com o título de “Aristion” (Excelência) pela grega Academia de Atenas, originalmente fundada por Platão. Aos 77 anos, morando no bairro da Lagoa, na zona sul do Rio, ele continua produzindo ativamente, mesmo durante a pandemia, e compartilhou suas experiências acadêmicas em entrevista concedida por telefone ao Boletim FAPERJ.

BOLETIM FAPERJ: Como você recebeu a notícia da sua indicação entre os cientistas “mais influentes” do mundo, segundo o artigo publicado na PLOS Biology?

Constantino Tsallis: Estou muito feliz por representar o Brasil e a Ciência brasileira internacionalmente. A posição que fiquei, 1.660, na classificação geral do ranking, entre os cerca de 160 mil pesquisadores de instituições dos mais diversos países indicados, corresponde ao 1% superior destes 160 mil. Esta lista inclui também vários outros cientistas do Rio de Janeiro, o que evidencia a pujança científica de nosso estado. Acredito que a escolha do meu nome se deu principalmente porque em 1988 publiquei um trabalho em uma revista internacional de Física Estatística, o Journal of Statistical Physics. Intitulado Possible generalization of Boltzmann-Gibbs statistics, esse é, desde 1945, ano do fim da Segunda Guerra, até hoje, o trabalho mais citado, dentre todas as áreas do conhecimento, cujos autores são exclusivamente brasileiros. Na base de dados Web of Science, dentre os 1.097.193 artigos listados com o endereço Brasil, excluindo grandes colaborações multinacionais, esse meu paper de 1988 é o mais citado, com 5.716 citações.

Qual a importância do INCT de Sistemas Complexos, projeto que você fundou e coordenou por oito anos?

A iniciativa de estimular a pesquisa em rede, por meio dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), é muito importante, pois fortalece a comunicação entre cientistas de diversas instituições. O nosso INCT, sediado no CBPF e hoje coordenado pelo professor Evaldo Curado, tem 34 cientistas, de 18 instituições de todo o Brasil, interagindo em todo o território nacional. Esse intercâmbio é um diferencial para o sucesso dos estudos. O INCT de Sistemas Complexos foi criado em 2008 pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, e conta com o financiamento do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] e da FAPERJ. Seus objetivos são focalizar, de modo integrado, pesquisas nas seguintes áreas: Complexidade em sistemas biológicos; Complexidade em sistemas econômicos; Mecânica estatística não extensiva - Teoria e aplicações; e Processamento de sinais e imagens para fins de análise, detecção e predição. 

Em poucas palavras, o que é a ‘Estatística de Tsallis’ e de que maneira ela pode fazer a diferença no cotidiano das pessoas comuns? 

A estatística e a entropia que são citadas com meu nome constituem uma teoria dentro da área de estudo da Mecânica Estatística moderna e dos Sistemas Dinâmicos Complexos. Ela tem várias aplicabilidades práticas. Engenheiros da Índia, por exemplo, usaram esta teoria para a detecção inicial do câncer de mama. Outra aplicação é detectar a saúde de uma estrutura de Engenharia Civil, como um prédio, uma ponte, uma ciclovia, que está em más condições, porém, antes que aconteça o desastre. Ela permite calcular a entropia de sistemas dinâmicos complexos e outros. Entropia é uma medida da desordem. Quanto maior a desordem, maior a entropia e vice-versa. Se a desordem é zero, significa que o sistema está completamente ordenado e sua entropia vale zero. No caso da Engenharia Civil, instala-se um microfone sensível numa parede da estrutura e ele detecta as microfraturas que estão acontecendo no material a partir do som. Fazemos o estudo e analisamos o padrão dos sons produzidos pelas microfraturas no interior da construção. Afinal, um edifício não cai do nada, ao longo do tempo vão se formando fraturas minúsculas dentro da estrutura danificada, que de repente se tornam uma macrofratura. Por isso, essa área de estudo, dos Sistemas Dinâmicos Complexos, introduzida no CBPF e no Brasil, é tão fascinante. Atualmente, me dedico a essa pesquisa e também estudo a conexão da entropia com redes diversas, como as de computadores, redes neuronais, de alimentação, ecológicas e de aviação, que representam os itinerários dos aviões.

Quando você criou a ‘Estatística de Tsallis’ esperava que ela fosse ganhar notoriedade e ser utilizada em aplicações práticas?

Eu não imaginava ser inovador quando jovem, mas era dedicado, curioso, entusiasmado, e acabei sendo premiado com alguns conhecimentos interessantes na vida profissional. Quando formulei, em 1988, o artigo de cinco mil citações, nem remotamente imaginava que a teoria  pudesse ser um dia útil para ajudar no diagnóstico do câncer de mama. Por isso é importante investir em pesquisa básica, porque muitas aplicações surgem de forma espontânea. Não criei a teoria tendo em vista a aplicabilidade, mas tendo em vista o conhecimento. Quando se investe em pesquisa básica, as inovações surgem naturalmente.

Na sua visão, quais são os maiores desafios para atrair os jovens para as carreiras de pesquisa na área de Exatas? 

Um ingrediente fundamental, que deveria ser determinante para os jovens, é a ousadia. Na ciência há de se ter ousadia intelectual. É preciso pensar em um certo problema e atacá-lo com uma perspectiva nova. E a ousadia faz parte da juventude. Esse é um gancho que pode atrair os jovens para a Ciência. O pensador francês Jean Cocteau ponderou que todo mundo sabia que era impossível, mas teve um que não sabia, foi lá e fez. Outros acham que não é possível, mas o cientista vai lá e, de repente, resolve.

Nesse momento da pandemia causada pelo novo coronavírus, qual a importância de se dar continuidade às políticas de fomento à Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) no País?

A vida moderna é cheia de problemas. Para resolvê-los, alguns são triviais e outros exigem dedicação e estudo, por serem muito específicos. É aí que entra a Ciência. Um de nossos maiores problemas hoje é a pandemia, que nos preocupa, mas há diversos outros problemas socioeconômicos, tecnológicos, de comunicação, como os de redes de satélites, da preservação da riqueza imensa na Amazônia e no Pantanal, enfim... Negar a importância da Ciência é querer voltar à Idade da Pedra. O desmonte das instituições e a escassez de recursos para a Ciência é um sinal de retrocesso. Nesse cenário, a FAPERJ se torna ainda mais relevante, por ser uma instituição fantástica para o estado do Rio de Janeiro, como são todas as agências de fomento estaduais, federais e privadas. E o Rio de Janeiro tem uma longa tradição científica, que começa de certa maneira com Carlos Chagas, Oswaldo Cruz e tantos outros, e deve preservar essa condição. O próprio CBPF, onde trabalho, teve como seu fundador mor César Lattes, físico notável que poderia ter sido laureado com o Prêmio Nobel pelas suas contribuições na descoberta e estudo do méson pi.

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