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Publicado em: 10/08/2017
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Traçando novos rumos para a educação fluminense*

Danielle Kiffer 

Ainda hoje referência quando se fala em educação pública, o Ciep 
aparece no desenho de estudantes (Imagem: Divulgação)

Nos anos 1980, o então recém-eleito governador do estado do Rio de Janeiro, Leonel Brizola (1922-2004), implantou no estado os famosos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps). Popularmente chamados brizolões, eles propunham o ensino em período integral para estudantes da rede pública municipal e estadual. Passados mais de 30 anos, a ideia vem sendo objeto dos estudos da pesquisadora Lígia Martha Coimbra da Costa Coelho, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). Como trabalhou com o antropólogo e escritor Darcy Ribeiro, idealizador dos Cieps, durante todo esse tempo, ela vem estudando a questão da educação em tempo integral e defende a ideia do turno único.

“Quando se divide, na parte da manhã as aulas regulares e na parte da tarde, os jogos, a parte lúdica, acaba-se induzindo os estudantes a pensarem que o primeiro turno é ruim e o segundo é bom. É preciso reelaborar a organização curricular das escolas, a fim de que conhecimentos – a parte teórica, como matemática e física – e saberes – os temas que complementam os conhecimentos – se juntem em um único turno”, diz.

De acordo com o site do Ministério da Educação (MEC), as atividades de educação integral podem ser definidas como estratégias para o acompanhamento pedagógico diário da aprendizagem quanto às linguagens, à matemática, às ciências da natureza, às ciências humanas, bem como quanto ao desenvolvimento de atividades culturais, artísticas, esportivas e de lazer. E podem ainda incluir a abertura das escolas aos finais de semana.

Ela destaca que, diante do que preconiza o programa Mais Educação, criado em 2007 pelo MEC, os alunos que frequentam o programa participam, no contraturno – isto é, no segundo turno –, de oficinas em que a atividades lúdicas têm destaque, nos esportes e nas artes. Essas atividades são oferecidas por monitores que recebem uma ajuda de custo, atendendo à lei do voluntariado. “Na verdade, acho muito positivo que monitores participem do trabalho desenvolvido pelas escolas. Mas apenas como apoio e não no papel principal, de oferecer atividades que, por sua natureza, precisariam estar integradas às atividades regulares”, diz Lígia.

Outra questão envolvendo o Mais Educação e que preocupa a pesquisadora é o fato de as escolas não adotarem a educação em tempo integral para todos os alunos, mas apenas para aqueles que estão em defasagem de idade/série; aqueles cujas famílias estão inscritas no bolsa-família; e para aqueles que estão em situação de vulnerabilidade porque moram em comunidades violentas. “Não deve haver separação na educação. Historicamente, a educação integral era para todas as pessoas. Paul Robin [1837-1912], educador francês que atuou como um dos principais pensadores anarquistas europeus e foi um dos precursores das experiências de educação libertária, é um exemplo. No orfanato Cempuis, na região Norte da França, onde Robin era diretor, em um momento, as crianças estavam aprendendo aritmética; mas, em outro, estavam ajudando na limpeza da sala de aula. Isso porque ele fazia questão de que os estudantes não fizessem diferença entre trabalho intelectual e trabalho manual: tudo era trabalho e trabalho era produção humana. Quando vemos hoje em dia a questão do turno e do contraturno, do tempo integral para alguns alunos, pode-se perceber que não se trata dessa educação integral, mas a que visa, em primeiro plano, a proteção integral. Será essa a primeira natureza da escola pública?”, questiona.

Lígia da Costa Coelho (à direita) e sua equipe defendem
o
 turno único na educação.  (Foto: Divulgação) 

Ao longo dos últimos anos, pensando em contribuir para a melhoria do ensino, Lígia vem desenvolvendo pesquisas sobre o tema da educação integral em tempo integral, e de como ela vem sendo abordada nos municípios do estado. De 2008 a 2010, por encomenda da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), do MEC, Lígia participou de duas pesquisas para conhecer e analisar experiências de jornada ampliada existentes no Brasil, em termos quantitativos e qualitativos. “O que me provocou muita inquietação é que, dentre todo o País, os municípios do Rio de Janeiro foram os que menos devolveram os questionários daquela investigação. Foi a partir daí que resolvi investigar o estado”, diz a professora.

Para avaliar como a educação integral está sendo abordada e integrada pelos municípios fluminenses, ela realizou, com apoio do programa Auxílio Básico à Pesquisa (APQ 1), da FAPERJ, uma pesquisa por todo o estado. Seu objetivo foi subsidiar ações que garantissem que as novas escolas que vêm sendo implementadas em território fluminense pudessem, de fato, oferecer educação em tempo integral para os alunos da rede municipal e estadual.

Nesse mesmo esforço, Lígia analisou a organização curricular das políticas públicas de educação em tempo integral apresentadas pelas redes de ensino do estado. Para tanto, ela e uma equipe da universidade, que compõe o Núcleo de Estudos – Tempos, Espaços e Educação Integral (Neephi) – fundado em 1995 – elaboraram um questionário de avaliação, que foi enviado aos representantes dos 92 municípios do estado do Rio. O questionário contou com perguntas fechadas, que objetivaram saber se o município possuía/pretendia instituir política de tempo integral em sua rede de ensino, e, em caso afirmativo, se essa política já existia – fruto de gestão anterior – ou se havia sido iniciada na gestão 2013-2016.

Em outro ponto do questionário, perguntava-se se essa política tinha o Mais Educação em sua base e se havia uma proposta e/ou documentos escritos que a fundamentassem, e se o município, por meio de sua Secretaria Municipal de Educação, disponibilizaria as propostas e documentos para o estudo que Lígia e sua equipe realizavam. Dois meses depois de enviados, os dados foram recolhidos, organizados e quantificados, tendo sido utilizados na elaboração de planilhas e transformados em gráficos. Dos 92 municípios, 79 colaboraram com a pesquisa.

A pesquisadora conta que ficou surpresa com muitas das respostas enviadas pelos representantes das secretarias municipais de educação, ressaltando que alguns dos questionários trouxeram informações bastante úteis para a implementação de uma boa base educativa para o ensino integral em tempo integral. “Apesar da falta de verba ou de verba insuficiente, escolas em Mesquita, Petrópolis e Niterói, por exemplo, estavam, à época, gradativamente, praticando o ensino integral para todos os alunos em algumas de suas unidades escolares. Percebemos que muitos municípios estavam discutindo, buscando desenvolver suas próprias propostas. Isso nos mostra que o Mais Educação fomentou uma discussão sobre o ensino integral, mas não se transformou em uma camisa de força. Havia ideias diferentes sendo postas em prática nos municípios fluminenses”, avalia.

A professora também percebeu, em algumas “falas”, uma preocupação com a questão social que atinge as crianças. Lígia observou que a importância da escola era constantemente ressaltada nos questionários, principalmente como espaço de aprendizagens, o que possibilitava um outro olhar dessas crianças para a sociedade. “Ao se referir ao Mais Educação, um dos respondentes postulou que ele possibilitava ‘mudar a oficina de ciclos em ciclos’. Em outras palavras, para esse gestor, o fato de a criança estar na escola, com atividades sempre dinâmicas e modificáveis, era algo desejável, uma vez que essa criança/aluno não estaria na rua, em situação de vulnerabilidade. Isso mostra que uma preocupação social mais ampla não estava sendo negligenciada.” Ela, no entanto, ressalta que essa preocupação não deve suplantar aquela referente à apropriação dos conhecimentos, que caracteriza a natureza primeira da instituição escolar.

De acordo com a pesquisadora, outro ponto importante que apareceu nas pesquisas foi que a organização curricular para a concretização de políticas de tempo integral ainda é um desafio a ser vencido nos municípios do estado do Rio de Janeiro que participaram da enquete. “Vários municípios vêm experimentando novos desenhos curriculares, compreendendo que elementos como tempo, espaços, sujeitos e atividades são essenciais na construção de uma organização diferenciada que realmente procure alcançar o tempo integral com educação integral referenciada nos pressupostos político-filosóficos que o município estabeleça. E isso por meio do coletivo de profissionais que constrói o projeto-base. No entanto, essas experiências ainda não possibilitaram perceber mudanças significativas na escolaridade dos alunos, até porque a maioria dos projetos que vem se desenvolvendo nessas cidades acontecem em instituições escolares isoladas, ou ainda, para alguns alunos de uma mesma unidade escolar – e não para toda a rede de ensino.”

Para aproximar as ideias e implementar ações que fortifiquem a educação em tempo integral no Rio de Janeiro, Lígia e a equipe do Neephi vêm promovendo fóruns que reúnem  os representantes de escolas e secretarias de educação de diversos municípios do Rio. “Começamos a realizar esses fóruns em 1995, e terminamos os debates em 2003, por diversos motivos, como a descontinuidade da política pública fluminense em tempo integral. Em março de 2014, com a retomada das discussões sobre o tema da educação integral em tempo integral e o crescente interesse dos municípios em relação a esse debate, as reuniões recomeçaram”.

*Reportagem originalmente publicada em Rio Pesquisa, Ano VIII, Nº 33 (Dezembro de 2015)

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