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Publicado em: 25/11/2010
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Tuberculose: doença frequente no passado do Rio de Janeiro

Vilma Homero

Na Unidade de Paleogenética, do Laboratório de Genética Molecular de Microorganismos, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), todo cuidado é pouco. Ali, as precauções são no sentido de evitar que material de DNA moderno possa entrar em contato com os restos esqueletais datados dos séculos XVII a XIX que estão sendo analisados. Descobertas durante a restauração da antiga Catedral da Sé, atual Igreja do Carmo, para as comemorações dos 200 anos da chegada da família real portuguesa ao Brasil, essas amostras revelaram alguns aspectos de interesse para os pesquisadores: que os esqueletos encontrados em camadas mais próximas à superfície eram de adultos jovens de ascendência européia. Além disso, em um número significativo de amostras foi possível constatar a presença de DNA antigo de bactérias do complexo Mycobacterium tuberculosis, agentes causadores da tuberculose, uma doença tão frequente no passado quanto nos dias atuais, na cidade do Rio de Janeiro. O que os pesquisadores, coordenados por Alena Mayo Iñiguez, agora querem verificar é a presença do DNA do patógeno em outros sítios arqueológicos da cidade para revelar as linhagens circulantes nos séculos passados e saber como a doença evoluiu ao longo do tempo. Para isso, o projeto conta com financiamento da FAPERJ, por meio do Auxílio Básico à Pesquisa (APQ 1).

Esse trabalho de busca nem sempre se mostrou fácil. Do projeto inicial, que tinha como objetivo analisar, por meio de técnicas moleculares, a presença do DNA de micro-organismos causadores de doenças comuns entre os séculos XVII e XIX – como a própria tuberculose (Mycobacterium tuberculosis), a peste bubônica (Yersinia pestis), a cólera (Vibrium cholera), e parasitoses intestinais, como a ascaridíase (Ascaris lumbricoides) e a enterobíase (Enterobius vermicularis) –, a pesquisa acabou limitando o leque. "O trabalho em paleogenética é difícil, dispendioso e extremamente especializado. Ao executar a análise com a técnica da PCR, vimos que o DNA das amostras coletadas estava extremamente danificado pela ação do tempo e da erosão. Como a reação enzimática da técnica só dá resultados satisfatórios quando o DNA das amostras se mantém íntegro, somente foi possível detectar e recuperar o DNA humano dos indivíduos, mas não o dos patógenos selecionados", explica a pesquisadora.

O que é compreensível. Embora a coleta paleogenética, realizada durante a descoberta dos achados, tenha sido feita com todo o rigor necessário, o material estava bastante danificado. Além das amostras ósseas, foram coletados também sedimentos representativos de tecidos moles do indivíduo, como sedimentos das regiões pulmonar, intestinal, bucal e das fossas nasais. "Participamos da escavação junto com os arqueólogos, sempre fazendo uso de equipamentos de proteção individual e de material estéril para a coleta e preservação das amostras, segundo as recomendações para a autenticidade do estudo com DNA antigo. Os esqueletos, especialmente os dos enterramentos secundários, ou seja, de camadas mais profundas do solo, estavam em terreno encharcado, já que toda aquela área sofre com a ação da subida das marés. Temos que lembrar que a capela que deu origem à antiga Catedral da Sé foi construída muito próxima ao litoral", explica Alena.

A solução foi mudar de técnica, passando para análise por hibridação de ácidos nucléicos, que possibilita a identificação do DNA mesmo em amostras altamente fragmentadas. "Nesse processo, usa-se um marcador – no caso, um fragmento específico do DNA do parasito que se deseja rastrear – para identificar se esta sequência de DNA está contida na amostra, mesmo que fragmentada", detalha Alena. No caso da tuberculose, os resultados positivos em várias amostras fizeram com que o foco do trabalho fosse modificado. "Limitamos o escopo de nossa pesquisa e mudamos a abordagem. De 39 amostras até então analisadas, 22 apresentaram um resultado compatível com a presença do bacilo da tuberculose. Mas é preciso ressaltar que essas 39 amostras não significam 39 indivíduos, já que incluem também a análise de amostras diferentes do mesmo indivíduo, de sedimentos da região pulmonar e das fossas nasais, por exemplo, onde a presença da micobactéria seria mais provável. Estamos felizes com essa nova abordagem."

A técnica da hibridação está sendo utilizada como uma espécie de screening inicial, como explica a pesquisadora. A partir desses primeiros resultados, a equipe pode dar continuidade ao trabalho, ampliando as análises e aplicando outras metodologias. Segundo os especialistas, a disposição dos corpos – com as mãos cruzadas sobre a região da pelve e os pés voltados na direção do altar da igreja – indicaria tratar-se de religiosos. Nos enterramentos primários da Igreja Nossa Senhora do Carmo, isso é corroborado pelos resultados obtidos na análise paleogenética que confirmam a ascendência européia dos indivíduos. Já nos enterramentos secundários, foram identificados um indivíduo de origem ameríndia e outro de origem africana, o que leva a supor que a área teria sido usada como cemitério em época anterior à construção da igreja, possivelmente a partir de 1589, quando ainda era uma capela.

O próximo passo, segundo Alena, é continuar investindo em recursos ainda mais avançados para continuar trabalhando com esses e outros materiais. "Cada vez mais temos conhecimento de técnicas e abordagens genéticas, mais sensíveis e avançadas que podem ser aplicadas aos estudos paleogenéticos", diz a pesquisadora. A ideia agora é analisar amostras ósseas, encontradas em outros dois sítios arqueológicos, do período histórico do Rio de Janeiro: o Cemitério dos Pretos Novos, no bairro Gamboa, e o cemitério descoberto na área da Praça XV, no Centro da cidade. "Com isso pretendemos descobrir as linhagens das micobactérias que circulavam naquele período e traçar uma trajetória da doença até os tempos atuais."

 

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