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Publicado em: 10/05/2007
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A educação de índios e desvalidos no Brasil de 1870 a 1910

Vinicius Zepeda 

   IHGB/Estado do Pará (1901-1909)

  

  Meninas índias eram educadas por freiras da Ordem
 da Lombardia no Instituto Santo Antônio do Prata, PA


Entre os anos de 1870 e 1910, uma série de iniciativas voltadas para o ensino de profissões e da língua portuguesa entre índios, crianças de rua e filhos de escravas nascidos após a assinatura da Lei do Ventre Livre, foi tomada pelo governo central e governos locais do país. Neste período, as autoridades, associadas a missionários de ordens religiosas católicas, criaram vários asilos, internatos e externatos com aprendizado de atividades que servissem à economia da época. As informações são parte de um estudo desenvolvido entre os anos de 2005 e 2006 pela psicóloga e doutora em História Irma Rizzini. O trabalho, desenvolvido na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), contou com o apoio da FAPERJ através de uma bolsa de Fixação de Pesquisador, e resultou em diversos artigos e publicações sobre o tema.

O estudo desenvolvido pela pesquisadora em Ensino Profissional no Brasil (1870-1910): Internatos para Desvalidos e Indígenas chama a atenção para o fato de haver encontrado relatos extremamente contraditórios no que toca à eficiência destas políticas. “Não há como precisarmos realmente a qualidade delas, uma vez que a maior parte dos documentos da república, com o propósito de desqualificar o império, afirmam que as instituições anteriores nada formaram”, explica a psicóloga. “Esta posição fica clara, por exemplo, no relatório produzido por José Veríssimo em 1890 – um ano após a Proclamação da República no Brasil – quando ocupou o cargo de diretor geral da Instrução Pública do Governo do Estado do Pará”, acrescenta.

 

A pesquisa fez uma análise comparada do trabalho em instituições voltadas para a formação profissional de meninos e meninas pobres, indígenas e ‘ingênuos’ - termo usado na época para designar negros livres e desamparados nascidos após 1871 – ano da assinatura da Lei do Ventre Livre – no Amazonas, Pará, Maranhão, Pernambuco e Rio de Janeiro. “As instituições resultaram de iniciativas oficiais dos governos das províncias e do governo central, e de particulares, como religiosos e industriais. No período, os asilos e institutos profissionais surgiam com a intenção de associar o ensino primário ao profissional, este voltado para a atividade artesanal e agrícola”, ensina a pesquisadora.

 

 IHGB/Estado do Pará (1901-1909)
      

Banda de músicos do Instituto Santo Antônio do Prata

 

Entre os muitos asilos e institutos que existiram naquele período, a pesquisadora optou por destacar em seu estudo os casos do Asilo de Meninos Desvalidos (RJ, 1875); Colônia Orfanológica Isabel (PE, 1875); Instituto de Artes e Ofícios e Agrícola da Providência (PA, 1883), Instituto Santo Antônio do Prata (PA, 1898) e as Casas de Educandos Artífices, quase todas instaladas nas regiões Norte e Nordeste e criadas por iniciativa dos governos locais ao longo do Segundo Reinado. “No Rio de Janeiro, o Asilo dos Meninos tinha o objetivo de recolher crianças abandonadas, educar e ensinar um ofício para que pudessem servir de mão-de-obra na indústria e no comércio da cidade. Já os dois institutos paraenses tinham por finalidade ensinar aos filhos dos índios os ofícios artesanais e, sobretudo, o trabalho na agricultura” , conta Irma. 

 

O trabalho desenvolvido por Irma Rizzini foi concluído em 2006. Porém, suas pesquisas sobre o assunto continuam. Hoje ela é professora adjunta da Faculdade de Educação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e desenvolve uma nova pesquisa no Proedes (Programa de Estudos e Documentação Educação e Sociedade) sobre outras instituições do mesmo período. “No Proedes, temos um acervo enorme de documentos sobre a história da educação no Brasil, cujas coleções estão descritas no sitio do centro de documentação. Só sobre o Asilo de Meninos Desvalidos, são mais de 34 mil documentos catalogados para pesquisa”, contabiliza.

 

Anos de 1909/1910 foram divisores de água na formação profissional

 

De acordo com Irma Rizzini, os anos de 1909 e 1910 representaram um marco nas iniciativas voltadas para a formação do quadro profissional no país. “As Casas e Institutos de Educandos Artífices, que eram internatos mantidos pelos governos locais, foram gradativamente extintos. Neles, o educando morava longe da família, e o contato com os pais, tutores ou protetores era regulado pelas instituições”, lembra a pesquisadora.  A partir de 1910, o governo federal inicia uma política de fundação de Escolas de Aprendizes Artífices, em regime de externato, destinados à formação de trabalhadores. “Contudo, para o aprendizado agrícola e artesanal dos filhos dos índios, foram mantidos os internatos, que passaram a ser instalados dentro dos territórios indígenas, por missionários, como os monges capuchinhos, que associados ao governo, tinham o objetivo de civilizá-los e catequizá-los”, acrescenta.

 

 Album do Estado do Pará (1901-1909)

 

 Crianças indígenas de tribos consideradas 'selvagens' (à esq.) eram educadas por
  ordens religiosas como a Missão da Conceição do Araguaya, do Estado do Pará

 

Foram fundadas Escolas de Aprendizes Artífices nas capitais de dez estados do país, muitas delas situadas em cidades onde anteriormente existiram as Casas ou Institutos de Educandos Artífices. “Com isso, o governo federal passou a assumir a formação da mão-de-obra para a indústria, criando programas de caráter nacional voltados para uma formação genérica, e não para um determinado ofício mecânico, como havia sido à época do Império”, diz Irma.

 

Ainda em 1910, chama atenção também a criação do SPI (Serviço de Proteção aos Índios e Localização dos Trabalhadores Nacionais). O objetivo do serviço era centralizar as ações, civilizar os índios dentro da política, cultura, economia e sociedade brasileira. “Além disto, também servia para liberar territórios para ocupação pelo estado nacional.”

 

Irma Rizzini lembra a visão acerca dos indígenas que permeava as ações dos governos durante o século XIX. “A crença existente era que eles deveriam ser civilizados segundo o modelo dos colonizadores e que não eram muito aptos à atividade intelectual mas sim ao trabalho manual”, afirma. “No caso da Amazônia, os índios são representados na documentação, separados em duas categorias: “mansos” ou “domesticados”, de um lado, para designar aqueles que já realizavam algum tipo de intercâmbio comercial com a população das cidades e não ofereciam resistência aos chamados civilizados; do outro, os "selvagens", como eram chamados aqueles que ofereciam resistência, não tinham contato com a civilização ou se recusavam a ter, e eram temidos pela população por alguns supostos ataques que eventualmente realizavam”, explica.

 

Para a pesquisadora, toda essa política centrada na formação profissional teve alcance limitado. “Cabe ressaltarmos que as instituições atendiam a um número limitado de crianças frente à situação de pobreza da população e à restrita abrangência da educação pública no período. Além disso, meus estudos concluíram que, à medida que essas instituições voltadas para o ensino profissional ganhavam prestígio e status social, tinham suas finalidades desvirtuadas”, afirma. “Isso ocorria por causa do clientelismo que caracterizava as relações do estado brasileiro com a sociedade. Ou seja, pessoas pobres, mas não necessariamente desvalidas como aquelas para as quais a instituição se voltava, eram incluídas em seu quadro graças às relações de apadrinhamento”, conclui.

 

 

 

 

 

 

 

 

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