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Publicado em: 04/02/2021 | Atualizado em: 05/02/2021
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Bailes de jazz contribuiram para emancipação feminina

Juliana Passos

Charge publicada na revista Careta em  23 de junho de 1921
retrata o medo dos homens diante dos novos comportamentos

Não fosse a pandemia, o País estaria tomado pelos festejos de Carnaval nos próximos dias, com foliões vivendo momentos de êxtase, liberação e transgressão. Mas enquanto o samba ainda conquistava espaços no início do século XX, a década de 1920 foi marcada pelos bailes de jazz como momento de contestação para as mulheres, especialmente para as classes médias, com repercussão nas revistas destinadas ao público feminino da época. Estudiosa do período Republicano, a historiadora e professora na Universidade Federal Fluminense (UFF) Karla Carloni passou a ler sobre o período por curiosidade, até perceber que o assunto poderia ser objeto interessante de pesquisa. "Trata-se de um objeto da História Cultural, que durante o período republicano brasileiro, ao qual dedico meus estudos, tem relação intensa com as realidades política, social e econômica", diz.

Em seu projeto atual, que conta com financiamento do programa Jovem Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ, a pesquisadora utiliza as revistas ilustradas publicadas na década de 1920 no Rio de Janeiro para compreender como mulheres de classes média e alta, em sua grande maioria brancas, entravam em contato com danças originalmente nascidas no circuito da diáspora negra nas Américas. Em especial o jazz, gênero que se tornou praticamente hegemônico e se misturou com outras manifestações, como o maxixe no Brasil, nas principais capitais ocidentais após a Primeira Guerra. Segundo Karla, o movimento teve como conseqüência a formulação de um novo léxico corporal. "Percebi um processo de apropriação e ressignificação no qual a transgressão corpórea proporcionada pelos movimentos polirritimicos do corpo e os 'requebros' predominantes nas danças negras impulsionou e ao mesmo tempo foi impulsionado por profundas transformações nas relações de entre homens e mulheres da camada social estudada", conta.

Entre os exemplos reunidos está uma publicação da revista Careta, de abril de 1923, que divulga uma pesquisa que teria sido realizada na França e que condenava o jazz. Entre as fontes consultadas, uma fonte identificada como "doutor Bertrand" comentava uma “série de enfermidades provenientes de tal prática”. Já a revista Fon-Fon considerava um "vexame" mulheres que requebravam os quadris nos bailes, ainda mais sem parceiros, usavam excesso de maquiagem e roupas muito sensuais. Estes e outros exemplos foram relatados pela pesquisadora em artigo publicado na Locus: Revista de História, em 2019.

Karla Carloni: 'Linguagem corporal é uma
forma transgressora de manifestação por 
parte dos segmentos fora dos padrões
pré-estabelecidos' (Foto: Arquivo pessoal)

A condenação da dança, de acordo com Karla, também passava pela preocupação com a imagem que seria enviada ao exterior sobre o País. Em crônicas publicadas pela literata Cecília Moncorvo Vasconcelos na revista Illustração Brasileira, em 1917 e 1925, ela considera que não seriam todas as danças capazes de levar "ao refinamento da alma", em alusão à proposta do cronista João do Rio.

As mudanças não ficaram restritas aos novos passos de dança e provocaram revolta entre os conservadores que apelidou o movimento de "geração jazz". A resistência às "endiabradas danças modernas" motivaram inúmeras colunas com discursos racistas e masculinistas, de acordo com a historiadora. "Esses discursos relacionavam a dança à promiscuidade e ao abandono das 'verdadeiras vocações da mulher': a maternidade e a família", comenta.

Nesse período, as redações dessas revistas eram constituídas em sua maioria por homens, uma vez que o estudo formal ainda era bastante restrito e as redações eram consideradas locais estritamente masculinos. A historiadora também nota que as revistas eram um modelo de negócio, precisavam atrair anunciantes, além de serem fundamentais na divulgação de valores. Karla entende que não se pode avaliar o conteúdo como um indicativo de passividade feminina, mas como retrato de uma disputa. "A modernidade encontrou no jazz a sua ‘trilha sonora’ por ser ele próprio transgressor. A música também foi manejada por aqueles que possuíam as suas batalhas individuais contra antigas e novas formas de opressão, como as mulheres, os trabalhadores e os jovens", escreveu em artigo publicado na revista Estudo Ibero-Americanos em 2018. "Pensar como a linguagem corporal e outros recursos da dança podem ser compreendidos, ao mesmo tempo, como vetores e reflexos de transformações de diferentes ordens, é um tema muito desafiador e fértil. Há ainda muito o que  pesquisar e dialogar com outras áreas de conhecimento", finaliza.

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