Danielle Kiffer
Arquivo Nacional / Correio da Manhã |
Além da UTF, várias associações passaram a reivindicar melhorias, como luz, água e direito à permanência no morro |
Ocupações informais em certas áreas da cidade a partir de meados do século XIX, as favelas foram se tornando cada vez mais presentes na paisagem do Rio de Janeiro. Nelas, eram proibidas as construções em alvenaria, e houve até decretos, das décadas de 1940 e 1950, declarando que suas construções eram clandestinas, e, portanto, eram proibidos o aluguel, a compra e a venda de imóveis. "Por isso, até 1980, havia tantas habitações em madeira nas favelas. A generalização das construções em alvenaria só começou bem mais tarde. Mas além da proibição, os moradores se sentiam inseguros diante das constantes ameaças de remoção. A precariedade física e jurídica era uma forma de controle social do Estado." Essa mesma precariedade dava origem à política da bica d’água, em que políticos prometiam pequenas melhorias no morro – que sempre sofreram a carência de serviços públicos essenciais – em troca de apoio eleitoral.
A União dos Trabalhadores Favelados (UTF) surgiu, em abril de 1954, diante da ameaça de remoção do Morro do Borel. Confrontados com a possibilidade de despejo, os moradores da comunidade se reuniram e procuraram a ajuda de um advogado renomado, de família tradicional, Antoine de Magarinos Torres. À época, morador do vizinho bairro da Usina, ele aceitou o desafio. "Dessa forma, a UTF foi criada como um movimento pioneiro não pela associação de moradores, que já existiam em outras favelas, mas por promover a articulação entre as associações", explica o pesquisador. Segundo Rafael, a partir da UTF, foram formados diversos subcomitês para reivindicar o direito a serviços de luz, de água, de urbanização e o direito de permanência. "Pesquisando em arquivos, pude comprovar, em alguns documentos, a presença da UTF nos Morros do Salgueiro, na Tijuca; do Jacarezinho, de Mata Machado, no Alto da Boa Vista, e em uma série de outras favelas", completa. Esta articulação não se limitava somente a questões políticas, mas também permitia uma relação solidária entre as favelas. Rafael conta, por exemplo, que, quando o Morro do Santo Antônio, no Centro do Rio, foi destruído, o Morro do Borel recebeu parte dos moradores desabrigados.
Divulgação |
Nos jornais, as notícias mostram a articulação e as reivindicações das associações de favelas |
Apesar de não estar vinculada ao partido comunista, a UTF contava com o apoio de diversos militantes, fato observado, inclusive, pela cobertura ostensiva do jornal comunista Imprensa Popular. Com a crise no partido comunista, a partir da segunda metade dos anos 1950, a UTF também começou a declinar. Em 1959, foi substituída pela Coalizão dos Trabalhadores Favelados da Cidade do Rio de janeiro, tornando-se o embrião para a formação da Federação de Associações de Favelas do Estado da Guanabara (Fafeg) e mais tarde para a Federação de Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj).
Rafael entende que é preciso analisar essa história e repensar a questão das favelas de forma diferente. "Elas não podem ser vistas como uma solução e nem como o problema da cidade, mas elas existem, são um fato. É muito mais válido pensar em sua urbanização como uma necessidade, por exemplo. É necessário que se pense o valor social que as favelas representam, regularizá-las, formalizá-las", resume.
Seu projeto será transformado em documentário, em parceria com o historiador Mauro Amoroso, com filmagens previstas para iniciar em agosto. "O objetivo é usar o filme para ampliar a educação e a consciência a respeito de toda essa história, amenizando o preconceito que existe sobre as favelas", conclui.
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