Vilma Homero
Divulgação |
A microbiologista Clarisa Palatnik de Sousa comemora a licença definitiva da vacina contra leishmaniose canina |
Atualmente, a leishmaniose visceral é considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) uma das seis maiores endemias do planeta, por atingir cerca de 500 mil novos casos em humanos por ano. Transmitida na América pelo inseto Lutzomya longipalpis, que pica cães infectados e depois contamina também os humanos, a doença afeta, anualmente, 3 mil pessoas no Brasil. "O Brasil é um dos quatro países no mundo que concentra 90% dos casos. Embora não seja endêmica no Rio de Janeiro, a leishmaniose atinge principalmente o Nordeste, com o maior número de casos (64,2%), enquanto o Sudeste e Centro-Oeste detém 13,63% e 8,22% dos doentes, respectivamente", fala Clarisa Beatriz.
Como explica a pesquisadora, a atual política de saúde pública determina que os cães contaminados sejam sacrificados. "Estamos motivados tanto pela necessidade de poupar esses animais quanto em diminuir a incidência da doença. A leishmaniose é uma infecção que afeta sobretudo o baço, fígado e medula óssea, provocando imunosupressão", esclarece.
Como ainda não existe vacina para humanos, uma forma para erradicar a doença é por meio da imunização dos cães – que constituem reservatório da doença –, como já foi confirmado pelos estudos feitos. "Os dados epidemiológicos de Araçatuba e Belo Horizonte, já publicados, mostram que essa medida contribui para reduzir significativamente o número de casos em humanos e cães", confirma a pesquisadora.
Ela explica que a vacina estimula a imunidade celular no cão, aumenta os linfócitos CD8, produtores de interferon gama, e aumenta o teor de anticorpos. Isso tem efeito bastante amplo. Como a pesquisadora esclarece, ao sugar o cão vacinado, o inseto também ingere anticorpos, que impedem o desenvolvimento dos parasitas em seu intestino. Com isso, aquele inseto não mais infectará outros cães nem humanos, interrompendo-se a cadeia de contaminação. "A vacina é um bloqueador da transmissão", afirma.
Do lado esquerdo da imagem, mostra-se a atuação da vacina em reduzir de forma significativa a concentração do Leishmania |
Segundo Clarisa, para garantir esses bons resultados, é preciso aplicar três doses de vacina durante o primeiro ano, e reforçar a imunização com mais uma dose anual. Outra vantagem da vacina brasileira é que sua fórmula demonstrou uma proteção cruzada contra a leishmaniose tegumentar, ou de pele. "Embora isso ainda não tenha sido testado em cães, apenas em camundongos, a vacina também se mostrou eficaz na proteção contra a leishmaniose tegumentar", diz a pesquisadora.
"Isso acontece porque o antígeno principal da Leishmune é a nucleosídeo hidrolase de Leishmania donovani. Esta enzima está presente em outras leishmanias e por isso serviu de base para o desenvolvimento de uma vacina gênica e recombinante que gera proteção cruzada. Isso quer dizer que a vacina tanto atua contra a leishmaniose tipo visceral quanto contra o tipo tegumentar", explica.
A pesquisa, que desde 1993 resultou na patente da vacina para UFRJ, vem sendo licenciada para produção em escala comercial desde 2003, em associação com a empresa americana Fort Dodge, mais tarde adquirida pela Pfizer. Atualmente recebeu a licença definitiva e, com isso, firma-se como uma enorme contribuição para a erradicação da leishmaniose visceral canina.
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