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Publicado em: 03/02/2011
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Homo deletabilis : uma reflexão sobre a vida moderna

Danielle Kiffer

 

 Reprodução

    

   Ritmo acelerado típico da vida 
   moderna é abordado no livro

Sob a pressão de um número crescente de informações, e no ritmo acelerado da vida moderna, memória e esquecimento parecem cada vez mais próximos, remetendo à nossa relação com o tempo. Nesse cenário, em que as sociedades atuais parecem marcadas por uma certa despolitização, e a corrosão dos laços sociais e afetivos também são frequentes, nada mais simbólico do que as teclas save/delete do computador. Segundo a filósofa Maria Cristina Franco Ferraz, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), essas teclas “expressam a lógica do descarte que atinge diversas práticas, da vida empresarial às relações afetivas”. Sua tese é apresentada no livro Homo deletabilis - Corpo, percepção, esquecimento: do século XIX ao XXI, publicado pela editora Garamond e patrocinado por recursos do Auxílio à Editoração, (APQ 3), da FAPERJ.

 

“Reflito sobre a complexidade do fenômeno com vistas à compreensão de certos sintomas contemporâneos, como, por exemplo, o temor crescente às sombras do esquecimento”, diz a pesquisadora. Ela explica que sua pesquisa parte de um diagnóstico acerca da tensão entre o tempo vivido e a velocidade dos fluxos das sociedades atuais. Nesse contexto, segundo a pesquisadora, “a internet é uma invenção a ser encarada como um efeito – e ao mesmo tempo como um instrumento – de certas transformações históricas. Como afirmou o filósofo Gilles Deleuze, as máquinas são, antes de mais nada, sociais. Logo, trata-se, antes, de desenvolver perspectivas críticas e teóricas aptas a contribuírem para o dimensionamento efetivo do que está em jogo nessas transformações históricas.”

Memória e esquecimento que, para a pesquisadora, representam “processos inevitavelmente ligados à temporalidade vivida, e por isso, fenômenos mais problemáticos” também são analisados no livro. Em Homo deletabilis, ela recorre a filósofos como Gilles Deleuze, Platão e, sobretudo, Nietzsche e Bergson para analisar todas essas questões.

 

Na atualidade, o esquecimento não é mais uma característica somente das pessoas mais velhas. A filósofa explica este fenômeno em um trecho de seu livro: “A disponibilidade requerida àqueles que têm acesso a um fluxo frenético de informações, nas atividades mais cotidianas – quando, por exemplo, somos obrigados a nos recordar de variadas senhas para acessar múltiplos serviços –, também contribui para a corrosão paulatina da capacidade de lembrar”. E completa: “Notícias que chegam pelos mais variados meios, em tempo real, na velocidade com que se sucedem e se apagam ou se neutralizam mutuamente, solapam a consistência dos eventos, colaborando para produzir evidentes efeitos de esquecimento”.

 

Como consequência de todo este fluxo intenso e veloz de informações, segundo Maria Cristina, o homem se torna cada vez mais sujeito a males, como síndrome do pânico, ou a síndrome de burnout. Como ela explica, a palavra burnout, que em português significa queimar por completo, está associada ao estresse profissional, como resultado da submissão a regimes de trabalho sob intensa pressão e instabilidade constante. Não por acaso, um de seus traços característicos é a perda de memória. “A pressão por produtividade e a lógica da descartabilidade, tanto nas relações de trabalho quanto nas ligações pessoais, terminam por promover um curto-circuito no sentimento de continuidade daquilo que é vivido e termina produzindo couraças que impedem a livre circulação dos afetos, abrindo vastos espaços brancos na memória”, enfatiza.

 

Se a vida imita a arte ou a arte imita a vida, não é possível precisar. Entretanto, na primeira década do século XXI, segundo Maria Cristina Ferraz, o sentimento de fragmentação, descontinuação e esgarçamento das lembranças foi significativamente representado nas telas. Basta lembrar filmes, como Amnésia, de Christopher Nolan (2001); Spider, de David Cronenberg (2002); O homem sem passado, de Aki Kaurismäki (2002); Violação de privacidade, de Omar Naim (2004); O pagamento, de John Woo (2004) e Brilho eterno de uma mente sem lembranças, de Michel Gondry (2004). Alguns deles são alvo de reflexão da autora, como forma de ilustrar a análise que faz em seu livro sobre a vida moderna.

 

“Não se trata de julgar, mas de desenvolver um gesto crítico que nada tem de rancoroso ou de nostálgico. Afinal, cada cultura, cada sociedade ou formação histórica conhecem a ‘dor e a delícia’ de ser aquilo que se tornam. A minha estratégia neste livro foi a de retomar algumas perspectivas originais do final do século XIX, especialmente as de Henri Bergson e Friedrich Nietzsche, para confrontá-las às novas crenças. Meu livro pretende-se um alerta, um diagnóstico e uma indicação, aqui e ali, de algumas promessas de saída, a serem gestadas por cada um”, conclui.

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