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Publicado em: 05/08/2010
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Pesquisadores identificam planta que neutraliza os efeitos do veneno da surucucu

Elena Mandarim

 

 Divulgação/UFF

   
     Planta utilizada no estudo, o Barbatimão está
   presente em áreas de cerrado, do Pará ao Paraná
Pesquisa realizada na Universidade Federal Fluminense (UFF) identificou um extrato vegetal capaz de neutralizar completamente o veneno da cobra surucucu, a mais letal encontrada em território brasileiro. A notícia da descoberta, que ganhou amplo destaque na mídia na segunda quinzena de julho, é resultado do projeto coordenado por André Lopes Fuly, Jovem Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. O estudo, que incluiu o trabalho de mestrado de Rafael Cisne de Paula, teve como objetivo investigar a ação de 12 plantas nativas sobre diferentes alterações biológicas provocadas pelo envenenamento decorrente do ataque da surucucu. “Os exemplares apresentaram diferentes graus de eficácia, sendo que o extrato de Barbatimão se mostrou 100% eficiente para reverter os efeitos do veneno da surucucu”, diz Fuly. 

 

A planta Stryphnodendron barbatiman é conhecida por barbatimão, barbatiman, casca da virgindade, entre outros. É encontrada em regiões de cerrado, desde o Pará até o Paraná. À árvore, que pode alcançar três metros de altura, já era atribuída, de acordo com a sabedoria popular, benefícios cicatrizantes, anti-hemorrágicos e anticoagulantes, além de ser usada no tratamento da diarreia. Por essas propriedades farmacológicas, ganhou registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como agente fitoterápico e como cicatrizante. Condição que, para o pesquisador, poderá facilitar seu uso como terapia antiofídica.

 

Segundo Fuly, a serpente Lachesis muta, popularmente conhecida como surucucu, foi escolhida justamente por ser a cobra mais venenosa das Américas. Sua letalidade elevada pode ser atribuída à quantidade de peçonha inoculada e à variação de componentes tóxicos presentes na secreção. No Brasil, ela é encontrada em áreas de floresta, como a região amazônica e a Mata Atlântica. Seu comprimento pode chegar a quatro metros e seus hábitos são, preferencialmente, noturnos.

 

Fuly, que é professor do Departamento de Biologia Celular e Molecular, do Instituto de Biologia, da UFF, estuda as propriedades do veneno de animais peçonhentos, em busca de novos agentes, de origem natural e sintética, para sua inibição. A parte prática da pesquisa – análise dos efeitos dos extratos de plantas em reverter as alterações biológicas provocadas pelo veneno da surucucu – foi realizada no Laboratório de Venenos e Toxinas de Animais e Avaliação de Inibidores (Lavenotoxi).

 

O pesquisador explica que, in vivo, utilizando-se camundongos, foi observada atividade hemorrágica após a inoculação do veneno. Já in vitro, foram estudadas mais três reações: hemolítica – destruição de hemácias; proteolítica – alteração da função de proteínas, que pode levar a quadros hemorrágicos, necrose, edema, inchaço, falência renal; e coagulante – coagulação de sangue, que pode levar à obstrução de veias e artérias, causando distúrbios hemostáticos e hemorrágicos. “Das plantas avaliadas, o extrato de barbatimão foi capaz de inibir 100% todas as atividades testadas, seja in vivo ou in vitro”, conta o pesquisador.

 

De acordo com Fuly, o tratamento poderá ser feito por meio de emplastros, um tipo de curativo que adere à pele e mantém o medicamento em contato com a ferida, ou na forma de chá. Neste caso, testes comprovaram que mesmo após ser submetido a 30 minutos de aquecimento a 80oC, o extrato de barbatimão manteve seu efeito neutralizante contra o veneno da surucucu. “Outro aspecto muito positivo é o fato de não precisar ser armazenado sob refrigeração, já que regiões ribeirinhas ou distantes dos grandes centros, onde os casos de envenenamento por picada de cobra costumam acontecer, muitas vezes carecem de energia elétrica”, diz.

 

Motivações do estudo

 

Fuly diz que a motivação para realizar o estudo foi ter percebido que os altos índices de acidentes ofídicos oneram muito os cofres públicos. “Além do elevado custo de produção de soroterapia, sua eficácia contra o veneno da surucucu é menos evidente. E, muitas vezes, algumas das vítimas ficam com sequelas, tornando-se incapacitadas para o sistema produtivo. Trata-se, portanto, de um grave problema de saúde pública", diz. Para o pesquisador, a gravidade da situação está na origem da necessidade de se buscar alternativas viáveis à administração intravenosa do soro antiofídico, que é o tratamento atualmente preconizado pelo Ministério da Saúde.

 

 Divulgação/IVB
    
    Serpente Lachesi muta, a Surucucu: no topo
      da lista dos ataques mais letais de cobras 
O soro antiofídico é feito em três grandes centros do país: no Instituto Vital Brazil, em Niterói (RJ); no Instituto Butantã, em São Paulo; e na Fundação Ezequiel Dias, em Belo Horizonte. É produzido segundo o método descrito por Vital Brazil, em 1900, que consiste em inocular o veneno no sangue de cavalos para obter a produção de anticorpos. De produção cara, ele precisa ser armazenado em baixas temperaturas, o que dificulta sua distribuição e conservação, já que a maioria dos casos ocorre nos meses quentes e chuvosos, e na zona rural – onde há inúmeros locais sem energia elétrica.

 

Fuly explica que outra desvantagem é que o tratamento com soro reverte somente os efeitos sistêmicos, que resultam em alterações cardiorrespiratórias, distúrbios de coagulação, hemorragia, hipotensão e  óbito. E por ser ineficaz contra as lesões locais, como edemas, necrose de tecidos, hemorragia local, reações inflamatórias, podem deixar sequelas, como amputação e atrofia de membros. O pesquisador ressalta que alguns pacientes podem apresentar reações alérgicas ao soro e, em alguns casos, evoluir a choque anafilático e, consequentemente, ao óbito.

 

Diversidade cultural e biológica

 

A proposta do estudo surgiu da observação de práticas da medicina popular, na qual nativos, caboclos e índios relatam o uso de plantas como primeira opção de tratamento para diversas enfermidades, inclusive para acidentes ofídicos. “Foi a partir dessa observação que resolvemos avaliar as propriedades antiofídicas de 12 plantas brasileiras”, conta o pesquisador.

 

Fuly defende que as propriedades farmacológicas e biológicas de espécies da biodiversidade brasileira, já extensamente utilizadas por nativos e índios, devem ser validadas cientificamente para ampliar as possibilidades de tratamento e de terapia. “Temos cerca de 20% da flora mundial, mas somente 71 plantas têm registro na Anvisa como fitoterápicos, o que é um número inexpressivo”, diz. “Fica fácil deduzir, portanto, que várias propriedades terapêuticas estão sendo desperdiçadas, ou, pior, estão sendo pirateadas por outros países”.

 

De 2001 a 2009, segundo dados do Sistema de Informação de Agravos e Notificações do Ministério da Saúde (Sinan/MS), foram registrados 202.016 ataques de cobras no Brasil, dos quais 638 foram fatais e 2.992 deixaram sequelas. “Com uma média de 22.446 acidentes ofídicos por ano, o nosso estudo se mostra relevante”, diz Fuly. “E nossos resultados ainda servem para reafirnar a importância de se explorar nossa biodiversidade”, conclui.

 

O trabalho, além de contar com o suporte financeiro da FAPERJ, tem apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação e Inovação da UFF, e da International Foundation for Science (IFS), da Suécia.

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