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Publicado em: 03/02/2010
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O desenvolvimento científico no Brasil do século XIX

Vilma Homero

  Debret / Reprodução

 

     Cotidiano carioca: o abastecimento de água potável era
       feito nos diversos chafarizes espalhados pela cidade

No início do século XIX, um dos limites do centro do Rio de Janeiro era a rua da Vala. Formada em toda a sua extensão por um canal de esgoto, parcialmente coberto por lages, a atual Uruguaiana era, no discurso médico da época, um dos pontos insalubres da cidade. O alto dos morros, onde se localizavam quase todas as instituições religiosas, estava, ao contrário, entre as áreas consideradas como mais aprazíveis. O cotidiano dos habitantes do Rio era marcado pela convivência com regiões alagadiças – focos de mosquitos e doenças – e, ao mesmo tempo, pela dificuldade de abastecimento de água potável, apesar dos diversos chafarizes espalhados pela região urbana. Todos esses pontos considerados importantes da cidade à época da chegada da Corte portuguesa ao Brasil estão sinalizados no esquema cartográfico do livro que está sendo organizado pelas pesquisadoras Lorelai Kury,da Casa de Oswaldo Cruz (Fiocruz), e Heloísa Gesteira, do Museus de Astronomia e Ciências Afins (Mast). Fruto do seminário "As ciências no Brasil no período joanino", organizado pelas duas instituições e que, com apoio da FAPERJ, em 2008 discutiu o tema, o livro, atualmente objeto de negociações com uma editora universitária, deve sair ainda em 2010.

Com a criação de várias instituições científicas, como a Escola Médico-Cirúrgica e a Real Biblioteca, o pensamento corrente é de que a transferência da família real para o Rio de Janeiro seria um ponto de ruptura no desenvolvimento da ciência no país. Não é exatamente o que pensam os autores dos vários artigos reunidos no livro. Lorelai explica por quê: "Na verdade – e esse é um consenso entre os autores –, podemos, em certa medida, falar em continuidade de um processo que já vinha ocorrendo desde meados do século XVIII. Com a vinda de D. João – ele só se torna D. João VI depois da morte de D. Maria I –, as políticas de valorização da cidade como centro político só se fortalecem. E passa a predominar também a sensação de se imaginar o Rio Janeiro agora como centro de poder", diz Lorelai. Segundo a pesquisadora, paralela à construção de um campo científico, começava a se consolidar entre os homens de ciência lusoamericanos a certeza de que era possível produzir conhecimento numa nação situada nos trópicos.

Na segunda metade do século XVIII, foram fundadas, no Rio, a Academia Científica e a Casa de História Natural, numa tendência que prossegue, em princípios do XIX, quando se instalam por aqui diversas instituições, como a Real Biblioteca, a Real Academia Militar e o Jardim Botânico. Igualmente importantes para a ciência são a migração para o Brasil da Fisicatura Mor, órgão que fiscaliza o exercício da prática médica e normatiza a formação acadêmica; e da Imprensa Régia, com a publicação dos primeiros jornais e livros impressos no Rio de Janeiro e na Bahia, possibilitando a formação e aprimoramento de grupos técnicos e a divulgação de trabalhos científicos.

"A publicação de livros técnicos e manuais de medicina, por exemplo, é um grande diferencial para a formação científica no país", fala a pesquisadora. O Rio de Janeiro paulatinamente vai se tornando também um lugar de produção de conhecimento. "Criava-se no Brasil um espaço público letrado, de circulação de ideias e formação de opinião; estabeleciam-se novas formas de sociabilidade", explica a pesquisadora.

O fim das guerras napoleônicas, em 1815, marcou também o aumento na vinda de viajantes estrangeiros ao país e a quantidade de estudos sobre o Brasil cresce de forma significativa. "Foi um divisor de águas, já que a quantidade e a qualidade de informações, comparadas às pesquisas anteriores e publicações resultantes, passaram a ser enormes", diz a pesquisadora. O estabelecimento da Corte no Rio de Janeiro contribuiu para a manutenção da unidade territorial da América portuguesa. "Nesse sentido, a produção de conhecimento sobre o espaço e as populações brasileiras foi estratégica neste processo. Posteriormente, durante a Independência e a construção do Estado imperial, instituições criadas no período joanino tiveram papel de destaque no mapeamento da nação brasileira", explica Lorelai.

 Reprodução
 
 Criação do Jardim Botânico: um dos
   marcos para a ciência brasileira
Outro marco importante foi a criação, em 1808, da Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro – inicialmente nas dependências do Hospital Real Militar e Ultramar, e mais tarde sediada no antigo Colégio dos Jesuítas, sede do Hospital Real Militar e Ultramar, no morro do Castelo – institui-se o curso de cirurgia no Rio de Janeiro. Sua proposta curricular, inicialmente restrita a conhecimentos de cirurgia e de anatomia, passa a incluir também as disciplinas de anatomia e fisiologia, terapêutica cirúrgica e particular, medicina cirúrgica e obstétrica, medicina, química e elementos de matéria médica e de farmácia.

Antes da criação da escola, o exercício da medicina era facultado somente a físicos e cirurgiões licenciados pelo cirurgião-mor do Reino. Eles estavam habilitados apenas a aplicar sangrias e ventosas, a curar feridas e fraturas, mas eram impedidos de prescrever medicamentos, o que só era permitido a médicos formados em Coimbra. "A criação das escolas – e, posteriormente, das faculdades – de medicina significava também o fim dessas restrições e a possibilidade de formação de médicos no país", diz Lorelai. No exercício das práticas médicas, no entanto, convivem tanto os profissionais de formação acadêmica quanto aqueles, menos formais, que praticam o conhecimento popular.

Os próprios limites do centro da cidade também passam a se estender para os lados do Campo de Santana, onde já ocorriam algumas festas oficiais, com a valorização das terras em redor e a instalação de residências da nobreza na região. Com isso, obras públicas também começam a transformar toda aquela área. O mesmo acontece em São Cristóvão, com a mudança da família real para a quinta construída pelo comerciante português Elias Antonio Lopes naquele bairro.

"Nessa nova configuração, médicos e engenheiros ganham importância já que são os profissionais a ditar os critérios de salubridade que norteiam as mudanças na cidade", diz. Se até o início do século XIX, se olhava para o Rio de Janeiro como um lugar quase impossível de se viver, depois o olhar passa a ser mais pragmático, de intervenção, mas também mais otimista, de pensar o que se podia fazer para melhorar. "A ideia de incompatibilidade de uma civilização nos trópicos passa a se contrapor à formação de uma identidade nacional", conclui.

 

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