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Publicado em: 19/11/2009
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Mistura de teatro e dança afro conta um pouco da história do Rio do século XIX

Vinicius Zepeda

Fotos de Alba Ribeiro 

      
     O trabalho dos escravos negros no cafezal está entre os temas 
          abordados na peça, dirigida por Denise Mancebo Zenicola
 
Um pouco da história do Rio de Janeiro do século XIX é contada com dança afro-brasileira, lundu, samba, capoeira, funk, canto, percussão e teatro, numa linguagem contemporânea e tradicional na cultura banto: o cantar, dançar e batucar. É o espetáculo O Rio de Muane, que terá uma apresentação na próxima segunda-feira, 23 de novembro, às 16h, no Centro Coreográfico da Cidade do Rio de Janeiro (Rua José Higino, 115, Tijuca, Zona Norte do Rio). Muane é uma "tigre", responsável por transportar na cabeça latões ou cestos de excrementos humanos para serem lançados ao mar, na enseada de Botafogo. Como, por vezes, os dejetos escorriam, a pele desses escravos terminava rajada, semelhante à do felino selvagem e motivo do apelido. Dirigido e coreografado pela bailarina, coreógrafa, diretora teatral e professora da Universidade Estácio de Sá, Denise Mancebo Zenicola, a peça foi desenvolvida com auxílio do edital Apoio à Produção e Divulgação das Artes no Estado do Rio de Janeiro, da FAPERJ.

O Rio de Muane tem o roteiro livremente inspirado no conto "Cidade dos Sábios", de Luis Antônio Baptista. O espetáculo é resultado do projeto de pesquisa Tear-te, que durante o ano passado desenvolveu, com a participação de mais seis professores da universidade, diversas oficinas de dança, dramaturgia, voz e indumentária, voltadas para o estudo e elaboração de linguagem, estética e performance de dança-teatro afro-brasileiras. As oficinas começaram no campus Praça XI e depois foram para o campus Jacarepaguá. "O bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, é uma região da cidade com áreas remanescentes de quilombos, como o que se encontra perto dos estúdios do Projac, da Rede Globo. Como a região é cercada de morros, o acesso era difícil no século XIX, o que levou escravos fugitivos, descendentes ou libertos a se fixarem ali", explica Denise.

A peça já foi apresentada em alguns locais ao longo deste ano, como o Sesi Graça Aranha, UniRio, Sesc Copacabana, o teatro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e no CTC, em Botafogo. "A receptividade tem sido ótima. As pessoas se identificam e sensibilizam com a personagem da peça", explica Denise. A divulgação do trabalho tem um diferencial: é basicamente feita através da Internet. "Pudemos constatar o poder dessa mídia, uma vez que grande parte do público que compareceu aos espetáculos além de ex-participantes das oficinas e público em geral, foram membros da lista de e-mails, blogs, sites, redes de relacionamento."

     
  Teatro, dança e música: elementos fortes no espetáculo       


Já a professora da Universidade Estácio de Sá, Débora Campos, que também faz parte do elenco e trabalha nas oficinas de dança do Tear-te, destaca a importância de se contar uma história da cidade pelo ponto de vista dos que normalmente não têm voz, como o caso da escrava. E sem cair numa visão maniqueísta. "O Rio, depois da chegada da Família Real, em 1808, passa a apresentar intensa circulação de gente dos vários estados e estrangeiros nos portos. A cidade muda, novas ruas, novas áreas de circulação são criadas e, na segunda metade do século, com a construção de redes de esgoto, os tigres perdem sua função. Também, após a abolição da escravatura, quando a força do trabalho escravo passa a ser substituída pelos emigrantes, os negros vão sendo expulsos do centro da vida pública. As antigas amas-de-leite negras e até mesmo prostitutas são substituídas por brancas européias e marginalizadas", explica Débora.

"O espetáculo apresenta como Muane enfrenta com consciência a realidade adversa em que se encontra e principalmente como estabelece redes de troca e resistência na busca de cidadania e construção da sua subjetividade. Com o fim de seu trabalho como tigre, busca outros caminhos. E apesar das regulações, não deixa de dançar nas rodas de lundu, samba e capoeira. Nesse caso, dança e  música são elementos da ginga, estratégia de sobrevivência e resistência, lembrando que o jogo da  capoeira que se dança é o mesmo que pode matar", acrescenta Denise.

O reflexo da colonização portuguesa no Rio de Janeiro é outro ponto destacado no espetáculo. "Vivemos numa cidade mestiça, com marcantes traços da cultura negra, seja na alimentação, no modo de vestir, na cultura, enfim. Toda nossa identidade é fruto dos arranjos, das concessões, lutas e conflitos", explica Denise. Já o caso indígena é lembrado por ambas. Segundo elas, durante as oficinas de construção dos personagens, foram identificadas características típicas da cultura indígena entre os participantes do projeto.

O grupo envolvido no projeto Tear-te é formado por pesquisadores e artistas de diversas áreas, como letras, filosofia, ciências sociais e história, que vêm produzindo uma série de textos para a publicação de um livro. No que diz respeito à memória dos ancestrais, que aparece na peça, Denise e Débora destacam o resgate da tradição oral, herança da cultura africana banto e ioruba. "Utilizamos muito a memória de nossas avós para construir os personagens do espetáculo." O papel de Muane, personagem guerreira e forte, é outro destaque. "A importância do feminino é bem ilustrada na montagem e a personagem representa não apenas a escrava, mas também pessoas sem voz que ainda vemos nos dias de hoje, como moradores de rua e mulheres mais humildes, que tentam sobreviver a todas as dificuldades do cotidiano", explica Denise.

Para a diretora do espetáculo, o apoio da FAPERJ foi essencial para a realização de um sonho. "Ainda durante o doutorado tomei conhecimento do conto 'Cidade dos Sábios', vi ali a possibilidade de um dia roteirizar e fazer a adaptação para a cena. Com o financiamento da FAPERJ, pude montar as oficinas e realizar o espetáculo", explica a professora. Entretanto, ela chama a atenção para a necessidade de mais espaços para a divulgação da cultura negra na cidade. Um exemplo de incentivo a essa iniciativa é a Lei Estadual N 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino de cultura afro em escolas públicas do estado e estabeleceu o Dia de Zumbi, celebrado todo dia 20 de novembro, como Dia da Consciência Negra e feriado fluminense. "Falar sobre essas questões ajuda a divulgar mais a cultura afro. Mas ainda falta maior apoio da grande mídia. Nosso desejo é que a peça entre em circuito comercial em 2010. Para isso, precisamos que as empresas se mostrem interessadas em patrocinar a circulação do nosso espetáculo O Rio de Muane, encenado pelos atores bailarinos: Cátia Costa, Débora Campos, Carol Araujo, Viviane Santos, Kaio Ventura, Wander Paulus e Pedro Mota ", complementa.

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