Vilma Homero
Divulgação / Fiocruz |
O método elaborado pela bolsista Regina Macedo
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Micose sistêmica, a coccidioidomicose é adquirida por via inalatória e causada por duas espécies do fungo geofílico, ou seja, presentes no solo: Coccidioides immitis e Coccidioides posadasii. No Brasil, o agente dessa micose é o C. posadasii, encontrado em tocas de pequenos animais silvestres, como tatus. Ao revolver solo contaminado na tentativa de desentocar os animais durante a caça, o homem se contamina. Até praticamente o final da década de 1970 acreditava-se que se tratava de uma micose presente apenas no sudoeste dos Estados Unidos, principalmente nos estados da Califórnia, Arizona, Novo México e Texas, no México, em países da América Central e da América do Sul (Venezuela, Argentina e Colômbia). Somente em 1978 foi registrado o primeiro caso no país.
Para Regina, que começou a trabalhar como estagiária técnica de nível médio no laboratório há cerca de vinte anos na Fiocruz e nesse meio tempo concluiu graduação em Biologia (UERJ) e mestrado em Biologia Celular e Molecular no Instituto Oswaldo Cruz, o assunto agora é objeto de sua tese de doutorado, desenvolvida com apoio do peograma Bolsa Nota Dez, da FAPERJ. A pesquisa dá continuidade a anos de estudo sobre o tema, sob a orientação do professor Bodo Wanke.
Segundo o professor Bodo, aquele primeiro caso de coccidioimicose no país a princípio foi tratado como tuberculose. "Somente depois de uma biópsia foi possível identificar o agente causador da doença: o fungo Coccidioides immitis", diz ele. Transmitido por inalação, o fungo se instala nos pulmões, onde provoca lesões, que daí podem disseminar para outros órgãos como ossos, articulações, meninges, gânglios linfáticos e pele. Não há transmissão de humanos para humanos, nem de animais para humanos. "Sabe-se que o cachorro é igualmente suscetível à doença; já o tatu, embora hospedeiro, mostra-se resistente ao fungo", observa Bodo.
Divulgação / Fiocruz |
Professor Bodo Wanke: longos anos de pesquisas de fungos, como o Coccidioides e o Paracoccidioides |
Nas amostras, o professor Bodo percebeu que o Coccidioides muitas vezes se apresenta morfologicamente semelhante ao fungo Paracoccidioides, podendo levar à confusão entre as duas micoses. "Essa foi uma descoberta importante porque a paracoccidioimicose é bastante comum em todo o país", fala o professor. À época, como bolsista de nível técnico, Regina participou do isolamento e identificação do fungo Coccidioides e desde então, vem se dedicando, com o professor Bodo, às pesquisas sobre o Coccidioides e outros fungos de transmissão inalatória.
Agora, seu trabalho se volta para a forma de diagnóstico. "Depois de passar um tempo no laboratório do Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), estudando extração de DNA de amostras de solo com o professor e Cientista do Nosso Estado Alexandre Rosado, me deu o estalo: por que não aplicar a técnica para fazer a identificação molecular também de amostras contaminadas por fungos", conta.
Numa primeira fase, que aconteceu durante sua dissertação de mestrado, ela procurou desenhar iniciadores de DNA específicos do Coccidioides. "Isso porque numa mesma amostra de solo há DNA de uma floresta inteira. Era preciso então desenvolver um marcador específico para o fungo que queríamos identificar", explica.
Ela explica que a dificuldade de examinar material de solos contaminados é também pelo nível de risco para quem trabalha nos laboratórios. "O fungo está no grupo de patógenos de risco biológico de nível 3, numa escala que vai até 4", diz. Pelo método clássico, as amostras de material são colocadas em uma solução, onde o fungo flutua. No passo seguinte, esse material contendo o fungo é retirado e inoculado em camundongos. Quatro semanas mais tarde, os animais são sacrificados e necropsiados para identificar o fungo. "Isso se torna necessário devido à dificuldade de identificar o tipo de fungo em culturas de laboratório, já que milhares deles crescem de forma semelhante, sem características que os diferenciem", esclarece Regina. Uma vez inoculado nas cobaias, elas adoecem, e além dos sintomas característicos, cada fungo pode ser identificado de forma específica.
"Em vida livre, em solos sem incidência de sol, os fungos, particularmente o Coccidioides, não apresentam morfologia que os distinga. Mas, quando chegam ao hospedeiro, mudam sua morfologia e adquirem características que permitem a identificação", fala Bodo. "A extração de DNA do solo é realizada com um kit que permite a obtenção de um DNA de boa qualidade. Em seguida, esse DNA é submetido a uma amplificação com aditivos que bloqueiam a ação de possíveis inibidores da PCR, como ácidos húmicos" diz Regina.
A técnica foi testada com sucesso em amostras de solo relacionadas a surto da doença no munícipio de Elesbão Veloso, no Piauí. "Em dez amostras analisadas pelo método clássico de inoculação animal, obtivemos 30% de positividade, enquanto com a técnica molecular o rendimento foi de 100% de positividade. O que pode ser explicado pelo fato de que o fungo está presente no solo em baixa densidade, não sendo detectado pela inoculação animal. Porém, mesmo com poucas cópias de sequências gênicas do fungo no solo, a técnica molecular é sensível para detectar sua presença", esclarece Regina. Ela fala também que o método de identificação molecular a partir de amostras ambientais pode ser usado para detectar agentes causadores de outras micoses, como a esporotricose, pacoccidioidomicose, criptococose, de interesse para a saúde pública.
Para Regina, a pesquisa continua. "Agora prosseguimos no refinamento da abordagem molecular a ser utilizada, para chegarmos a uma melhor compreensão de como o fungo se comporta na natureza."
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