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Publicado em: 21/11/2002
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Famílias do Rio colonial

Marcos Patricio

Pinturas de Jean-Baptiste Debret (1768 - 1848)  
feitas no Rio de Janeiro entre 1816 e 1831
  

            Fixados nas igrejas com o objetivo de levantar eventuais impedimentos aos casamentos, os tradicionais proclamas podem revelar muito mais do que a origem das famílias formadas a partir da união religiosa. Pesquisa que está sendo realizada pelo arquiteto e historiador Nireu Oliveira Cavalcanti, com base nos matrimônios celebrados no Rio de Janeiro, entre 1600 e 1815, revela que esses documentos formam um valioso retrato da sociedade local nos tempos do Brasil Colônia.

            Por meio da pesquisa Formação das Famílias no Rio de Janeiro Colonial é possível verificar que, durante o século XVIII, o índice de casamentos no religioso era maior entre os casais de cor branca. O trabalho, apoiado pela FAPERJ, abrange, também, aspectos como os matrimônios inter-raciais e a iniciação sexual antes do casamento, resgatando um pouco dos costumes vigentes naquela época.

            Os levantamentos do pesquisador Nireu Cavalcanti têm como base os documentos de banhos (proclamas de casamentos) arquivados na Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro. O termo banhos, segundo o historiador, vem do alemão bann, que significa publicação. Alguns dicionários indicam que a palavra teria origem no latin bannu.

Professor da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense (UFF), Nireu Cavalcanti já resumiu o conteúdo de cerca de 1.600 documentos de banhos relativos aos nomes iniciados pelas letras  N, O, P e Q. Sua intenção é cobrir todos os 16 mil documentos guardados no subsolo da Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro. Em 2003 deverá ser editado livro com os resumos já concluídos. “Será uma fonte direta para os estudiosos e interessados no assunto”, afirma Nireu, doutor em História e especialista em Rio de Janeiro Colonial.

Maioria dos casamentos era entre brancos

            Apesar de só ter analisado aproximadamente 10% do total de documentos de banhos do acervo, o trabalho de Nireu Cavalcanti já permite constatar detalhes interessantes em relação a casamentos e raças. Entre os 101 registros de matrimônios no Rio de Janeiro, no fim do século XVIII, referentes à letra N, por exemplo, 70% envolviam casais de cor branca. Um percentual considerado alto, se for levado em conta uma estatística de 1796, segundo a qual 60% da população da Capitania do Rio de Janeiro era formada por pardos e negros, o que correspondia a 109.811 pessoas . A capitania tinha 182.757 habitantes, sendo 72.946 brancos.

            A escravidão, só abolida quase cem anos depois, em 1888, ajuda a explicar o menor percentual de casamentos inter-raciais envolvendo negros e pardos e entre estes e brancos. Dos 182.757 habitantes da Capitania, no fim do século XVIII, 84.064 (46%) eram escravos. Entre os 98.693 não escravos, a maioria era formada por brancos (72.946), seguida por pardos livres (19.165) e por negros livres (6.582). A maior parte dos casais não brancos acabava coabitando e não formalizava o casamento na igreja.

            Em relação aos casamentos inter-raciais, que somavam 30% dos matrimônios referentes à letra N (31 registros),  o estudo feito pelo historiador Nireu Cavalcanti mostra que a maioria, 11 deles, unia pardos entre si. São considerados pardos aqueles de cor intermediária entre o branco e o negro. Em meio às uniões inter-raciais, foram registrados, também, quatro casamentos entre crioulos (negros que nasciam escravos no Brasil por serem filhos de escravos); um matrimônio entre cabras (filho de mulato com negra, ou vice-versa); uma união entre um pardo e uma branca e, ainda, quatro casamentos de negros entre si. (veja abaixo o quadro completo). Pelo menos nessa amostragem de 31 casos analisada pelo pesquisador, é possível perceber que os homens negros (pretos vindos da África) não se misturaram. Os exemplos mostram, ainda, que os homens pardos procuravam casar com mulheres mais claras.

Casamentos inter-raciais (31 casos)

Marido

Mulher

Casos

Cabra

Cabra

01

Cabra

Parda

01

Crioulo

Crioula

04

Crioulo

Cabra

01

Crioulo

Parda

01

Pardo

Branca

01

Pardo

Parda

11

Pardo

Crioula

03

Pardo

Preta

04

Preto

Preta

04

            Pesquisa sobre moradias do Rio Colonial

O estudo Formação das famílias no Rio de Janeiro Colonial teve início a partir das pesquisas desenvolvidas por Nireu Cavalcanti, que buscava informações sobre os intelectuais e empregados da construção civil. Os dados serviriam de base para um livro sobre a moradia no Rio Colonial. Diante da variedade de informações obtidas no arquivo da Cúria Metropolitana, o pesquisador deu continuidade ao trabalho.

 “Com certeza, trata-se de um dos mais ricos acervos para o estudo da formação das famílias do Rio de Janeiro”, destaca Nireu, autor do dicionário sobre marcos históricos do Rio de Janeiro, obra que fala sobre os logradouros abertos na cidade durante o período colonial. Na pesquisa dos documentos de banhos, o historiador conta com o auxílio da museóloga Ângela Maria Duhá, encarregada de organizar a parte de genealogia; da aluna de graduação em Sociologia da Uerj, Aline da Silva Góis, bolsista de iniciação científica do projeto; de Vivian Zampa, mestranda em História da Uerj e de Ana Cláudia Rodrigues dos Santos, aluna de História da UFF.

No período colonial, o Brasil possuía dois bispados. Um em Salvador, que era responsável pela área que ia de Caravelas, na Bahia, até o Norte do país. O outro, no Rio de Janeiro, abrangia o território compreendido entre Caravelas e o extremo Sul do Brasil. O arquivo da Cúria Metropolitana guarda os documentos das localidades que hoje correspondem à cidade do Rio de Janeiro, Baixada Fluminense, Itaguaí, Sacra Família, Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá. A pesquisa se estende de 1600 até 1815, ano em que o Brasil foi elevado a Reino Unido ao de Portugal e Algarve (veja na cronologia, os principais fatos relacionados ao tema ocorridos no Brasil nesse período).

Além da divulgação da primeira etapa do estudo, Nireu Cavalcanti vai lançar, em 2003,  um livro com crônicas históricas do Rio Colonial, a partir do material levantado na pesquisa. Uma obra para retomar o gênero, que vai ajudar a compreender um pouco mais o comportamento da sociedade daquela época.  O livro será editado com apoio do Programa de Editoração da FAPERJ.

Cronologia

Os fatos desta cronologia ajudam a entender o período retratado na pesquisa no contexto histórico:

1532 – Provável ano da introdução dos primeiros escravos na colônia.
1548 – Chegada à colônia da primeira grande leva de escravos.
1565 – No dia 1� de março foi fundada a cidade do Rio de Janeiro.
1572 – Divisão da colônia em dois governos gerais. Um no Norte, com sede em Salvador, e outro no Sul, sediado no Rio de Janeiro.
1577 – Abolida a dualidade. A sede do governo geral do Brasil fica em Salvador.
1720 – Oficialização do Vice-Reino do Brasil.
1763 – Transferência da sede do governo do Brasil para a cidade do Rio de Janeiro.
1808 – A família real de Portugal chega ao Brasil no dia 22 de janeiro. Seis dias depois é decretada a abertura dos portos às nações amigas.
1815 – No dia 16 de dezembro, D. João VI eleva o Brasil à condição de Reino-Unido ao de Portugal e Algarve.

Leia mais:

Iniciação sexual antes do casamento

Pesquisador quer salvar documentos

 

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