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Publicado em: 14/06/2007
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Geógrafo da UFRJ analisa uso de patrimônios históricos e culturais

Mônica Maia

Divulgação 

   

      Imagem das praias constrói identidade carioca

Nos dias de hoje, as cidades são também concebidas como mercadorias e procuram se
"vender" de forma eficiente, atraente e rentável. Para isso criam imagens de si mesmas concretizadas em símbolos, que se tornam cartões-postais, atrativos turísticos ou comerciais, que podem variar conforme a história, a política ou as apostas econômicas e culturais do local. Para investigar essas relações, a formação desses símbolos e seus significados, o geógrafo Paulo César da Costa Gomes deu partida na pesquisa A cidade e as imagens, imagens da cidade: os espaços públicos como cenários de urbanidade. Ele propõe cinco viagens para traçar comparações entre as identidades urbanas de Rio de Janeiro e Paraty, no Brasil; Bordeaux e Pau, na França; e Barcelona, na Espanha.

Essa proposta, apoiada pelo programa Cientistas do Nosso Estado, é fruto de sua atuação no campo da Geografia Cultural - área definida como um ramo da Geografia, voltado para a distribuição espacial das manifestações culturais, como religiões, crenças, rituais, artes e formas de trabalho, enfim tudo que é resultado de uma criação ou transformação do homem sobre a natureza ou de suas relações com o espaço. Hoje, pode-se pensar na Geografia Cultural como aquela que considera os sentimentos e as idéias de um grupo ou povo sobre o espaço a partir da experiência vivida. É uma geografia do lugar. Sua relevância será estabelecida à medida que as referências culturais determinem as ações da sociedade sobre a natureza.

"A sociabilidade do Rio está muito ligada à praia. A partir dos anos 1940, 1950, tornou-se o espaço veiculado pela bossa nova, com símbolos como a garota de Ipanema. No início do século XX, no entanto, as imagens mais fortes da sociabilidade carioca se situavam em imagens da avenida Rio Branco, o Teatro Municipal, das áreas reformadas pelas obras do prefeito Pereira Passos. Esses espaços constroem as imagens que dão uma identidade à cidade", exemplifica o geógrafo.

Doutor em Geografia pela Sorbonne - Université de Paris IV, professor convidado nas universidades de La Rochelle, Pau, Lyon e Reims, hoje docente da UFRJ, Paulo César discute em seu livro A condição urbana - ensaios de geopolítica da cidade (Bertrand Brasil, 2001) como acontecem as mudanças e transformações nos cenários da vida pública, onde se celebra vida urbana, e a linguagem pela qual se identifica um tipo de urbanidade particular.

Patrimônios em mutação

Diante da competição no mercado global, as cidades precisam e procuram criar uma marca. "Cada vez mais se investe para dirigir e controlar o processo de construção das identidades urbanas. Na Europa hoje as cidades que não encontram uma imagem diferenciada ficam fora do circuito de investimentos, sobretudo do turístico. Montpellier, por exemplo, investiu fortemente e de forma explícita na criação de uma imagem, de uma marca. Era uma cidade francesa com um centro medieval pequeno e muitos imigrantes estrangeiros. Foram feitos diversos empreendimentos imobiliários, novos bairros, redesenho do centro, renovação integral do sistema de transportes urbanos, etc. Tentaram associar essas reformas à idéia de um viveiro de novas tecnologias e de novas oportunidades de investimentos. Todos tinham que conhecer esses novos espaços de tecnologia, a cidade ganhou notoriedade e valorização", exemplifica.

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Bordeaux aproveita patrimônio Luís XV
 

Segundo o pesquisador, seu projeto explica como e por que acontecem essas transformações: "Esse projeto investigará como a produção de um imaginário identitário se transformou em iniciativa dirigida como a de Bordeaux. Lá a estratégia foi valorizar o patrimônio que é todo da época e em estilo Luís XV. Todo esse patrimônio histórico e cultural é colocado em cena. Tudo que é Luís XV é encenado, criam-se eventos, exibem-se novos equipamentos e procura-se mostrar um "álbum de imagens", "narrativas especiais" que passam a conter os significados desejados", conta. Paulo César compara este caso ao fenômeno brasileiro no aproveitamento de patrimônio histórico fluminense em Paraty.

"Paraty vende a imagem da cidade do ouro, do caminho velho dos goyanazes. Quando olhamos a paisagem arquitetônica, constatamos que o casario é do século XIX e não do século XVIII, época do caminho do ouro. Fazemos esse tipo de curto-circuito histórico para criar identidade para as cidades. A partir dessas imagens são feitas diversas associações que alimentam esse imaginário. No caso de Paraty, por exemplo, a valorização do patrimônio se associa a um certo refinamento, inclusive intelectual. Desenvolve-se pois toda uma série de elementos associados então a isso, galerias de arte, artesanato, festival de literatura, de cinema. A memória colonial antiga é celebrada e serve de marca distintiva que prestigia a cidade e suas manifestações", analisa.

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Torres de Gaudí são marca
da arquitetura de Barcelona
   

Nessa perspectiva, o geógrafo aponta a Barcelona como o exemplo mais emblemático de cidade que revaloriza um tesouro: "A cidade detém um patrimônio imenso, que une arquitetura antiga e moderna, gótico, barroco, art-déco e art-nouveau, e conseguiu colocar tudo isso em cena associado à contemporaneidade. Com a Exposição Universal de 1888 e, mais recentemente, com os Jogos Olímpicos de 1992, por exemplo, produziu-se a idéia de que a cidade trabalha com valores positivos ligados à modernidade. Todos os novos arquitetos saíram de lá. Foi uma operação urbana muito bem-sucedida", diz Paulo César, lembrando que Barcelona é parte obrigatória do novo circuito cultural europeu.

Outro foco da pesquisa é a cidade de Pau, no sudoeste da França, na base dos Pirineus, onde o professor deu aula. "A cidade foi criada em cima da idéia do clima favorável, na montanha, local de recuperação da saúde - uma criação do século XIX. Agora, ela passou a vender imagem de ser a "Porta dos Pirineus". Vive da vista dessa cadeia montanhosa e tem como centro a avenida dos Pirineus, construída como uma seqüência de pontos de vista assinalados sobre uma muralha que acompanha essa sucessão de vistas panorâmicas", conta, evidenciando a estratégia de uma cidade pequena.

Os impasses das metrópoles

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O Cristo Redentor é reconhecido mundialmente
 como símbolo da cidade do Rio de Janeiro

Para o caso de uma metrópole brasileira como o Rio, o pesquisador vê a questão da imagem como um problema: "No Rio não estamos atravessando uma boa fase na produção de imagens. Temos no Fundão evidências disso com uma diminuição significativa do contingente de alunos de fora. Eles não querem mais estudar no Fundão porque a cidade está com uma imagem comprometida pela violência, e as operações relativas a um resgate não têm sido bem sucedidas", declara.

Já um símbolo como Copacabana merece outra abordagem: "É um espaço muito cheio de significados e por isso colocam-se diversas manifestações e grandes shows em Copacabana, concentra-se tudo em um mesmo lugar. Enquanto isso, outras áreas da cidade são esquecidas. O Centro, por exemplo, tem infra-estrutura, transporte e acesso de todas as regiões, é vazio nos finais de semana, seria ideal para esses grandes eventos. O poder público, no entanto, usa o que já existe e esgota as possibilidades desse espaço e não investe em outras coisas. Fica tudo concentrado em um espaço, a cidade fica exaurida", diagnostica. Ele ressalta que democracia e uso podem ser um caminho.

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 A praia de Copacabana é um dos espaços mais
populares e democráticos do Rio de Janeiro 

"A atual novela das 8h da TV Globo, Paraíso Tropical, com sua riqueza de personagens, mostra que
Copacabana é um grande espaço de mistura. Fundamental para se produzir o encontro e a co-presença entre grupos diferentes. No meu trabalho quero mostrar que as cidades que não vivem seus espaços públicos morrem. Copacabana é uma das raras áreas públicas que mantém a idéia de publicidade, reunindo comportamentos e populações diferentes e com fácil acessibilidade. A região da Lapa também é assim. Nesses espaços o fundamental é exatamente aquilo que foi restringido em outras áreas como na Barra da Tijuca", declara.

Segundo Paulo, o carioca de determinadas regiões está perdendo o hábito da rua. "As cidades são feitas disso. A cidade representa a democracia, é o espaço de encontro, de troca, de ver a diferença. Metrópoles como Londres, Paris trazem isso resumido em diversos espaços, em variadas ruas, em bairros inteiros, em parques etc. No Rio, talvez algumas praias da Zona Sul e parte da Lapa sejam as únicas áreas onde isso ocorre", argumenta.

Geografias em novos territórios

Para um acadêmico que já publicou ensaios sobre futebol e territorialização, contrapôs as causas e efeitos dos arrastões nas praias cariocas e dos casseurs (quebradores) das periferias francesas, a investigação dos fenômenos que envolvem conceitos básicos, como território, política e cidade, prosseguirá para as telas do cinema. O geógrafo gostaria de explorar mais a idéia de imagens da cidade através da análise de filmes. Um deles já começou a ser trabalhado - Cidade de Deus.

"A primeira cena do filme se passa em um conjunto habitacional. À medida que o filme avança, o espaço transforma-se em uma favela. Só vemos becos, vielas e construções não acabadas. Trata-se do mesmo lugar, do mesmo espaço, mas é como se fosse um outro. Essa transformação do cenário é acompanhada por uma transformação dos personagens, há uma cadeia simbólica nessa operação que precisamos analisar e isso fica bastante evidente quando olhamos as imagens fornecidas pelo cinema, por exemplo", diagnostica diante do filme brasileiro de maior repercussão internacional .

"Quero comparar com o filme O ódio, de Mathieu Kassovitz", avisa. O diretor francês ganhou o César de Melhor Filme em 1995 abordando a violência na periferia parisiense sob o ponto de vista de três jovens, imigrantes de uma banlieue, e suas relações com a cidade. "É um universo de possibilidades", avisa. Se a Geografia Cultural analisa a dimensão espacial da cultura por intermédio de temas como os gêneros de vida, a paisagem cultural, áreas culturais, a história da cultura no espaço e ecologia cultural, o horizonte de pesquisa de Paulo César Gomes já mapeou novas possibilidades de interação disciplinar.

 

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